O Homer Vitruviano

O Homer Vitruviano
Leonardo quase acertou.

Wel Come Maguila, Mas Manda Flores No Dia Seguinte

Bem-vindos, párias, desgarrados, nerds, loucos de toda espécie ou, caso esse negócio não der certo, boas vindas às minhas demais personalidades. Façam-se ouvir, façam-se sentir, façam-se opinar. E, caso falte energia ou acabe a bateria, faça-se a luz!


domingo, 21 de novembro de 2010

Sir Paul In Poa


Mais uma vez eu me enrolo prá parir algumas letrinhas sobre um acontecimento cultural que marcou o meu ano. Quase três semanas depois, resolvo comentar o show que o Paul fez aqui na minha segunda casa, na beira do Guaíba. Anunciam hoje pela tevê a exibição de um dos shows de Sampa, depois que o Zeca Camargo e a Patrícia Poeta se recolherem para suas cavernas. Vou gravar, com certeza, mas só por mania. Tudo que eu gostaria de lembrar sobre o dia em que um Beatle tocou no meu estádio do coração está impresso como uma tatuagem nas minhas retinas. Imagens gravadas a ferro e fogo para que um improvável futuro vovô conte para os netinhos em seu leito de morte.

Ao texto, Falabella.

Quando foi anunciado o show do Paul em Porto Alegre, imediatamente me arrepiei. Tuitei ferozmente. Gastei os pontos do meu plano de celular ligando para amigos da velha guarda. Mandei dezenas de mensagens de texto, pressionando as letrinhas do teclado do telefone de duas em duas, sem conseguir fazer os polegares acertarem o alvo correto, tamanha era a excitação.

Um Beatle. Em Porto Alegre. No estádio do Inter!

Para um cara véio, meio decadente e decididamente anacrônico, era uma espécie de nirvana. Os meus sonhos de roqueiro frustrado tornando-se repentinamente, sem qualquer foreplay ou aviso telegrafado que me preparasse de antemão, uma realidade próxima e palpável.

Dividi a empolgação com as pessoas próximas. E com aquelas distantes também. Quem viveu a mesma vida que eu, e somos vários grazie a Dio, teve a ereção mais prolongada de sua existência.

Os imbecis que fizeram pouco caso do velho que se apresentaria na Capital logicamente não sabem muito bem do que são feitos os mitos. Preferem sacolejar ao som de uma banda de nu-metal progressivo (Helter Skelter prá vocês) ou refestelar-se no meio da multidão enquanto uma dupla de gordos sertanejos choraminga a dor dos cornos universitários (The Long and Winding Road procêis). São amadores. Infiéis. Membros de outra gangue. Feitos de outro barro.

Aliás, esse texto não tem como ser uma descrição precisa do espetáculo. Quem foi, viu. Quem não foi, bem, melhor sorte da próxima vez.

O fato é que nunca um show gerou tanta expectativa. Com um mês de antecedência, já era o assunto mais discutido num churrasco da César Vídeo. Mais que futebol. Mais que política. Mais que os seios da Scarlett Johansson.

Fui a Vitória-ES e voltei comentando com os amigos da velha guarda a vinda de Macca pro RS, todos salivando, com a mão suada e a mente nas nuvens. Um Beatle em Porto Alegre. “Parece um sonho”, como falou a minha mãe quando soube da notícia. Mas o sonho não acabou, como sentenciou Lennon? Está longe de acabar, como nos ensinou MacCartney.

Como descrever um show perfeito? Como escrever alguma palavrinha original depois de todas as loas já tecidas?

Para mim, basta talvez uma pequena declaração, com ar confessional: logo eu, o rocker que sempre preferiu os Stones aos Beatles, o Jagger ao Lennon, o Richards ao Macca; justo eu, que já tinha visto as Pedras Rolantes duas vezes e enchia a boca ao bradar que eram os melhores shows que eu já presenciara; pois eu estou convicto que presenciei o maior espetáculo da minha vida.

Em um dia e noite perfeitos, é difícil destacar alguma cena de maior relevância. Todos foram únicos. Da empolgação juvenil antes da entrada no show, das cervejas entornadas na fila ao frenesi quando finalmente adentramos o Beira Rio, todos foram momentos Kodak.

Quando o Macca subiu ao palco, o Beira veio abaixo, como se o Inter tivesse conquistado a terceira Libertadores. Já vi outros semideuses do Olimpo do rock antes (Jagger, Angus, Clapton, Dylan, Tyler), mas nenhum com a aura que carrega um ex-besouro capaz de fazer avós, filhos e netos disputar o mesmo metro quadrado pelas arquibancadas e pista de um estádio de futebol.

Uma festa ecumênica que juntou gerações para vibrar com um quase septuagenário sir que toca rock and roll como se fosse um teenager.

Meu amigo Mauro, o Negão, batia no meu ombro a cada hit. Hit? Nada disso. A cada petardo que marcou a história do rock. Jet, My Love, Obla-di-obla-da, Yesterday, Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, And I Love Her, Band On The Run, Drive My Car, Blackbird, Something, Back In The USSR, Paperback Writer, Day Tripper, começar por onde?

E o cara, do alto de uma nobreza de espírito que lhe rendeu com justiça o título de Sir, seguia ali como se fosse o mesmo cabeludo de quase meio século atrás, com uma jovialidade que nos fazia invejar o chá que os ingleses tomam às cinco da tarde. Quando o Beatle mostrou humildade insuspeita e entoou em claro e bom gauchês expressões como “tri legal”, ”ah, eu sou gaúcho” e ”mas, bah, tchê”, estava ali um cara que, com esforço, tentava falar a nossa língua. Mal sabia o neo bagual que nós já falávamos a língua dele há mais de 40 anos.

Macca ainda emendou Hey Jude, Live And Let Die e Let It Be com um só fôlego, o que fez Negão resumir o que acabara de ver assim: “é a melhor sequência de músicas da História!!!!!!!!”. Os vários pontos de exclamação que acompanharam a sentença de Negão só justificavam os meus olhos marejados. Pois eu chorei, como havia profetizado um mês antes. Não lágrimas furtivas e envergonhadas, daquelas derramadas no escuro do cinema ao final de um desenho da Pixar. Lágrimas orgulhosas e robustas, uma pequena deferência ao lorde roqueiro que nos fez ter certeza que o sonho definitivamente não acabou.

Como a minha mãe já tinha me dito, parecia um sonho. E foi.

4 comentários:

  1. pq foi abandonado o blog? preguiça? falta de insanos para te lerem? nada de importante aconteceu desde tropa de elite2 e o show do Paul?

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  2. Sophia, voltei, voltamos, insanamente iguais. E muito aconteceu desde lá.

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