O Homer Vitruviano

O Homer Vitruviano
Leonardo quase acertou.

Wel Come Maguila, Mas Manda Flores No Dia Seguinte

Bem-vindos, párias, desgarrados, nerds, loucos de toda espécie ou, caso esse negócio não der certo, boas vindas às minhas demais personalidades. Façam-se ouvir, façam-se sentir, façam-se opinar. E, caso falte energia ou acabe a bateria, faça-se a luz!


quinta-feira, 27 de junho de 2013

Rewind 2013 No Cinema - Parte 2

 
Essa segunda parte lista os filmes 101 a 200 vistos no ano, todos eles com micro-resenhas e uma nota. O numeral atribuído a cada nota não deve ser visto como uma sentençaO numeral atribuído a cada nota não deve ser visto como uma sentença definitiva. Em primeiro lugar, não se pode condensar toda a avaliação sobre uma obra, qualquer que seja, em um mero numeral, o que seria de um reducionismo pedestre. A nota serve, no caso dos comentários breves, como forma de ilustrar o que não coube no texto. 

Neste ano, assim como em 2012, utilizarei os seguintes parâmetros para quantificar as notas: 

-  notas 10: só para filmes que passaram no teste do tempo, ou seja, somente para filmes que permanecem excelentes mesmo após mais de 20 anos de seu lançamento;
- de 8 a 9: filmes ótimos;
- de 6 a 7,5: filmes bons;
- 5 ou 5,5: filmes razoáveis;
- abaixo de 5: filmes com variáveis graus de ruindade.

* Filmes vistos no cinema
** Filmes revistos 
Sublinhados: filmes que passaram no circuitão do RS em 2013 


* 101 - Antes da Meia-Noite (Before Midnight, 2013): um dos melhores projetos de cinema já feitos, a série "Antes de", de Richard Linklater (Escola do Rock), consiste em acompanhar o casal Jesse e Celine (Ethan Hawke e Julie Delpy) a cada nove anos, registrando o seu relacionamento através do tempo enquanto conversam e discutem sobre os mais variados assuntos, sempre em meio a um cenário turístico de cair o queixo. Em Antes do Amanhecer, acompanhamos o encontro dos dois jovens e a noite em claro que passam perambulando por Viena. Em Antes do Pôr-do-Sol, dois (ainda jovens) adultos se reencontram durante um dia em Paris. Aqui, Jesse e Celine reaparecem nove anos depois, já casados e pais de duas gêmeas, em férias na Grécia. O grande diferencial da série é a sua abordagem sensível e sincera dos relacionamentos e para isso em muito contribui a opção do roteiro ser escrito a seis mãos pelo diretor e seu casal de protagonistas. Muito mais do que apenas filmar dois atores conversando durante quase duas horas, Linklater nos traz não só uma radiografia precisa de todas as fases de uma relação, mas também um irresistível tratado sobre a personalidade humana através dos tempos (e situar as histórias em meio a locações com incrível bagagem histórica, além de servir como pretexto para abordar os mais diversos temas, também funciona como uma alegoria perfeita da temática do projeto). Hawke e Delpy estão mais à vontade do que nunca como Jesse e Celine, esses velhos conhecidos que encontramos de década em década, aqui maduros e cheios de imperfeições e contradições, um espelho da nossa própria existência. A sensação de estar envelhecendo junto com os personagens é um dos atrativos mais curiosos da série e só nos aproxima ainda mais desses adoráveis (e complexos) personagens. Sentimental sem nunca abandonar o racionalismo, bonito sem em momento algum pender para o superficial, Antes da Meia-Noite é, por isso mesmo, o filme mais romântico em muito, muito tempo. É imprescindível ver ou rever os dois primeiros antes de se aventurar nesse terceiro ato nas vidas de Jesse e Celine. E inevitável passar os próximos nove anos ansiosamente esperando pelo momento de reencontrá-los. Nota 9  

102 -  O Último Desafio (The Last Stand, 2013): o que poderia representar um retorno retumbante do ex-"Governator" Schwarzenegger à tela grande, depois de um hiato de uma década em que somente fez pontas no cinema (o pavoroso remake de A Volta Ao Mundo Em 80 Dias, Os Mercenários e sua seqüência) se tornou um fracasso monumental do ponto de vista comercial, arrecadando uma merreca, mesmo que não tenha custado tanto assim. O problema é que o diretor sul-coreano Kim Jee-Woon, vindo de três sucessos em sua terra natal (o terror Medo, a comédia Os Invencíveis e o thriller Eu Vi O Diabo) talvez tenha sofrido de excesso de confiança no material que tinha em mãos. Dá para notar visivelmente a vontade do diretor em tornar o que seria um filme de perseguição em uma homenagem honesta aos faroestes clássicos. Pena que o roteiro não ajude em nada. Os diálogos são vergonhosos e as situações armadas são dignas do mais furreca dos filmes B lançados diretamente nas locadoras. Empilhando clichê sobre clichê, a trama deixa pouco espaço para o velho Schwarzza brilhar. Ele continua aquele ator ruim de dar dó, mas é inegável que tem presença de cena, mesmo que o peso da idade pareça empalidecer o que antes era uma persona que impunha respeito em apenas um ou dois frames de seu queixo quadrado. É também muito problemática a escolha de Johnyy Knoxville (Jackass) como alívio cômico, algo que nunca combina com o resto do filme. Dos coadjuvantes, o que melhor se sai ainda é Rodrigo Santoro, que consegue dar a um personagem com o desenvolvimento dramático de uma vinheta publicitária o correto ar heróico que o arquétipo que interpreta exige. Na verdade, O Último Desafio é daqueles prazeres vergonhosos que todos nós temos. Como cinema, é uma diversão anacrônica. Mas ainda assim uma diversão. Nota 6,5

103 - Citadel (Citadel, 2012): co-produção entre Inglaterra e Irlanda, filmada nos subúrbios da Escócia, tenta fazer terror com viés de crítica social. Pena que a mensagem que deseja transmitir seja abortada no meio em prol de clichês batidos do gênero. A alegoria nem sequer está bem definida quando o filme resolve terminar. Bem antes de começar. Tem algum clima, mas é só. Nota 5 

104 - E Se Vivêssemos Todos Juntos? (Et si on vivait tous ensemble?, 2011): envelhecer na Europa deve ser barbada se comparado aos percalços da previdência sul-americana, mas aqui está uma visão muito sóbria da vivência digna na terceira idade. Engraçado e emocionante na medida, sem nunca descambar para o humor ou o sentimentalismo fáceis, lança mão de um trunfo muito importante representado por um elenco multinacional muito eficiente: a americana Jane Fonda (incrivelmente enxuta), o espanhol de ascendência alemã Daniel Brühl (Adeus, Lênin! e Bastardos Inglórios), a americana Geraldine Chaplin (sim, a filha de Charles, vista recentemente em O Impossível) e os franceses Guy Bedos, Claude Rich e Pierre Richard. Forma com O Excêntrico Hotel Marigold uma dupla quase perfeita. Nota 7

* 105 - Guerra Mundial Z (World War Z, 2013, em 3D): filme de zumbi sem sangue não tem a mesma graça. E Guerra Mundial Z é a primeira produção do gênero que não derrama uma gota de sangue nem mesmo quando determinada personagem tem o braço amputado!!!! Falta uma salutar dose de ketchup cenográfico ao filme para tornar a ameaça mais real, mesmo que as hordas digitais de zumbis mimetizando um formigueiro humano de fato sejam de cair o queixo. No final das contas, apesar da produção tumultuada que a transposição do livro para o cinema teve, com refilmagens, troca de roteiristas e brigas entre o protagonista Brad Pitt e o diretor Marc Forster, o saldo é bem positivo. Apesar de ainda ser visível a sensação de que é um filme muito mais de autoria do estúdio que o financiou do que dos artistas envolvidos na execução (o apelo "para todas as idades" é a causa da ausência de sangue), é um projeto honesto e que dá bastante certo enquanto entretenimento. Pitt faz bem o sujeito heróico, mas gente como a gente, que faz panquecas para as filhas de manhã e salva o mundo à tarde. Aliás, o marido de Angelina Jolie tem o cacife tão alto em Hollywood que exigiu que o seu personagem, um investigador da ONU, não precisasse tirar a camisa para exibir o físico durante momento algum da produção, o que pode ser decepcionante para a ala feminina, mas é um alívio para quem tem ódio de cenas gratuitas do gênero (Matthew McConaughey, por outro lado, deve ter uma cláusula pétrea em seus contratos que garanta pelo menos uma cena do estilo, nem que o filme se passe inteiro dentro de um tribunal de justiça). O prolífico operário-padrão Marc Forster, que salta de gênero em gênero com uma rapidez impressionante (são dele produções tão distintas entre si quanto Em Busca da Terra do Nunca, A Última Ceia, Mais Estranho Que A Ficção, O Caçador de Pipas e 007 - Quantum Of Solace) se recupera do tombo que levou com a incrível porcaria (e propaganda evangélica) Redenção, com Gerard Butler pregando o evangelho enquanto dizima africanos, demonstrando que aquilo foi mesmo uma mancada na carreira. Forster garante em Guerra Mundial Z um clima angustiante de tensão de cabo a rabo, mesmo quando as situações na tela apelem para a inverossimilhança completa (a cena da queda do avião parece saída do seriado 24 Horas ou da franquia 007, mas é muito bem executada). O roteiro é um festival de chavões (eu trocaria também de lugar o terceiro pelo segundo ato, terminando o filme com a sensacional perseguição em Jerusalém para amplificar o clímax, mas tudo bem...), mas comprova aquela máxima de que todo filme de zumbi é na realidade uma crítica social (aqui, ao crescimento demográfico desordenado de nosso planetinha azul). E quando a reflexão vem acompanhada de zumbis que correm como Usain Bolt, a lição fica bem mais divertida. O 3D convertido, como quase sempre, é completamente desnecessário. Nota 7,5 

106 - Deadgirl (Deadgirl, 2008): apesar de ter uma premissa perturbadora (dois adolescentes encontram um cadáver de uma jovem que ainda preserva sinais vitais e resolvem usá-la como escrava sexual), a execução é quase medíocre. Mais preocupante que o roteiro sem inspiração, que toma rumos totalmente previsíveis da metade para o final, o que mais incomoda é o elenco horroroso, pior que uma peça de escola. É muita transgressão para quase nada. Nota 5

107 - Maníaco (Maniac, 2012): refilmagem de produção do ano 1980 que ganha muitos pontos pela opção em filmar todo o filme do ponto de vista do protagonista serial killer, que é visto quase somente através de reflexos em espelhos, o que é, senão original, pelo menos muito corajoso (o que é surpreendente, visto que o diretor é o mesmo Franck Khalfoun do genérico P2 - Sem Saída). Do ponto de vista formal, é um trabalho muito acima da média, com toda a violência explícita que o tema poderia conter (marca registrada do produtor e corroteirista Alexandre Aja, de Alta Tensão e Viagem Maldita). Já o roteiro descamba para algumas bobagens padronizadas do gênero que não combinam com a premissa do projeto. Mesmo assim, é um filme potente, ajudado em muito pela performance de Elijah Wood, que pela segunda vez (depois de Sin City) consegue tomar partido do seu físico aparentemente frágil para tornar o personagem ameaçador. A trilha sonora, inspirada nos giallos italianos, é excelente. Para quem não se incomoda com cenas violentas, uma boa opção. Nota 7,5 

* 108 - Truque de Mestre: Os Ilusionistas (Now You See Me, 2013): filmes que envolvem a profissão dos mágicos (ou ilusionistas, como o dispensável subtítulo adotado na última hora pela distribuidora insiste em denominar) resultam quase sempre em produções originais e divertidas. Com Truque de Mestre, a regra não ganha uma exceção. As artimanhas empregadas pelos personagens em seus shows-roubos são sensacionais e fazem o público ter a sensação de estar assistindo a alguma apresentação milionária em algum cassino de Las Vegas. Mas há percalços no caminho. Como um programa do Mr. M, fica fácil desvendar os truques do roteiro, que não é nem de longe tão inteligente como os seus mágicos em cena. Em primeiro lugar, o que seria o principal trunfo do filme (o seu impressionante elenco) acaba jogando um balde de água fria no projeto. Reunir em cena Jesse Eisenberg (A Rede Social), Isla Fischer (Penetras Bom de Bico), Dave Franco (irmão mais novo de James Franco, visto recentemente em Meu Namorado É Um Zumbi), Woody Harrelson (Assassinos Por Natureza), Mark Ruffalo (Os Vingadores), Morgan Freeman (Seven) e Michael Caine (a trilogia Batman de Christopher Nolan) é, por si só, um chamariz irresistível para esse filme de assalto ambientado no mundo dos mágicos modernos. Pena que o roteiro escanteie justamente os personagens mais interessantes, os ilusionistas do título (Eisenberg, Harrelson, Fischer e Franco), que não ganham espaço e são relegados a meras caricaturas, praticamente só aparecendo em cena para realizar os truques de ilusionismo que movem a trama. Pior é que o protagonista é um Mark Ruffalo interpretando o personagem mais antipático de sua carreira, que em momento algum ganha a empatia da platéia, posição reservada exclusivamente para a personagem da gracinha Mélanie Laurent, de Bastardos Inglórios, que no entanto nunca ganha a chance de ultrapassar a sua condição de mera coadjuvante. Para piorar, a obrigatória "reviravolta" no final é mastigadinha demais e beira o vergonhoso. Mas como eu falei lá começo, filmes com mágicos sempre resultam em produtos divertidos (alguns deles inclusive têm aquele toque final que transforma os filmes em filmaços, como O Grande Truque, de Christopher Nolan). E Truque de Mestre não é diferente, muito pela boa (e vertiginosa) condução do filme, cortesia do francês Louis Leterrier (O Incrível Hulk). Como resultado, o filme apresenta muitos (e bons) truques, mas nenhum deles digno de ser qualificado como "de mestre". Nota 6,5 

109 - Amor À Distância (Going The Distance, 2010): é a velha fórmula aquela das comédias românticas, com o desenvolvimento da trama datilografado muito antes de acontecer, embalado por uma trilha que remete aos anos 80. Mas esse aqui surpreendentemente não irrita tanto, mesmo que o casal principal (Drew Barrymore e Justin Long) não tenha química alguma em cena. Pelo menos, dá prá apreciar belas paisagens de Los Angeles e Nova York, intercaladas com diálogos que demonstram que os realizadores tinham ciência das limitações que o gênero impõe. Não dói, mas também não revoluciona nada. Nota 6,5  

* 110 - O Homem de Aço (Man Of Steel, 2013, em 3D): começa bem esse recomeço para a franquia do Superman. De cara, já dá prá ver que Zack Snyder (diretor de 300, Watchmen, Sucker Punch) optou por escancarar a opção pelo gênero ficção científica na sua abordagem para o primeiro (e mais poderoso) dos super-heróis (as cenas em Krypton inclusive lembram uma variação sombria do mundo de Avatar). Ao encaminhar a trama para o planeta Terra, o filme encontra os seus melhores momentos ao registrar com muita criatividade a transição entre a infância, a adolescência e a fase adulta de Clark Kent, com flashbacks muito bem empregados e que deixam a produção com um ar original, cortesia provável do produtor Chritopher Nolan, que já dera nova vida a até então falecida carreira de Batman nos cinemas. A trilha de Hans Zimmer, que evita a todo momento os acordes icônicos de John Williams, dos Superman dos anos 80, também funciona que é uma maravilha. Já Henry Cavill (Imortais), se possui a boa estampa esperada para interpretar o Superman e não é tão ruim quanto Brandon Routh (Superman - O Retorno), não serve para lustrar os sapatos de Christopher Reeve, aparentemente até aqui a eterna personificação do herói. Já Michael Shannon está excepcional como o vilão General Zod. Os coadjuvantes são muito bons, principalmente Russell Crowe e Kevin Costner como os pais (kryptoniano e terráqueo, respectivamente) do protagonista. Por sua vez, Amy Adams como Lois Lane está apenas aceitável, em parte por culpa do roteiro, que insiste em colocar a personagem em toda e qualquer cena que possa aparecer. Mas é visível a ânsia em desvincular esse Homem de Aço da homenagem de Bryan Singer, em Superman - O Retorno, do filme clássico de Richard Donner em 1978. O Superman - O Retorno, de Singer, fez boa bilheteria em 2006 e ainda conseguiu boas críticas, mas permanece no imaginário dos fãs como um inexplicável fracasso, pois não contava com a dose esperada de cenas de ação que o projeto teria obrigação de entregar. Ironia das ironias, todo o problema de O Homem de Aço está reservado para o terceiro ato, em que Zack Snyder parece ter incorporado Michael Bay nos piores momentos da franquia Transformers, com uma extenuante (e INTERMINÁVEL) seqüência de destruição que, ao invés de empolgar, só cansa. Para piorar, o excesso de efeitos digitais, apesar de impressionantes em determinados momentos, faz o público ter a impressão de que está em frente a um videogame e não a um filme. Não há qualquer senso de perigo no clímax, justamente pelo excesso, o que é uma pena. Menos, nesse caso, representaria muito mais. No final das contas, O Homem de Aço tem saldo positivo, mas o gostinho que me deixou na boca está mais para O Homem de Pixels. Nota 7

111 - A Duquesa (The Duchess, 2008): ao final de A Duquesa (e isso não é spoiler), os letreiros explicam que a personagem real aqui biografada (Georgiana, a Duquesa de Devonshire, antepassada de Lady Di e com uma vida pessoal curiosamente parecida com a de Diana), foi uma das mulheres mais populares e politicamente influentes da história da realeza inglesa. Pena que o roteiro em nenhum momento dê o devido peso político para a personagem, optando ao invés por trilhar o caminho do melodrama romântico clássico e focar a trama no quadrilátero amoroso formado nos corredores palacianos. Mas tudo é tão visualmente deslumbrante que a direção de arte (indicada ao Oscar), a fotografia e os figurinos (que levaram a estatueta dourada) se encarregam, por si só, de conduzir o público. É uma reconstituição de época tão impressionante que leva o espectador facilmente à ilusão de estar convivendo com os personagens naqueles cenários opulentos. Keira Knightley está bem e a cada trabalho demonstra que nasceu para viver esses personagens de época. Mas o dono do campinho é mesmo Ralph Fiennes (indicado com justiça ao Globo de Ouro, mas vergonhosamente esquecido no Oscar), que confere a um personagem com potencial caricatural uma carga humana que faz toda a diferença, dotando o seu Duque de Devonshire de um distanciamento e uma frieza de fazer gelar a espinha. Nota 7  
112 -  Poucas Cinzas - Salvador Dalí (Little Ashes, 2008): apesar da temática muito interessante (o relacionamento do jovem poeta Federico García Lorca com o pintor Salvador Dalí, um romance mal resolvido que foi escondido durante anos e só revelado por Dalí no final da vida), é um filme que tropeça tremendamente na execução. Mal dirigido, montado de forma quase amadora e com um elenco de chorar, desperdiça até os personagens coadjuvantes (principalmente o cineasta Luís Buñuel e a esposa de Dalí, Gala), aqui retratados de forma rasa e caricatural. Já o desenvolvimento do filme é tão entediante que a impressão é que a qualquer momento vai entrar em cena o Pedro Bial recitando um dos discursos de eliminação do BBB. E o título nacional é uma picaretagem total, pois todo o filme é narrado sob o ponto de visto do protagonista García Lorca, interpretado com um inglês macarrônico pelo espanhol Javier Beltrán. Já Dalí ganha o corpo e o rosto eternamente apático do crepuscular Robert Pattinson, além do bigodinho mais fake das últimas décadas. Teve gente que afirmou categoricamente que Pattinson teve a melhor interpretação de sua carreira nesse filmeco, o que eu considero a mesma coisa que comparar os efeitos da gripe espanhola com os do vírus Ebola. Bom tema desperdiçado em um filme estranho, com elenco esquisito. Nota 4
113 - Perigo Por Encomenda (Premium Rush, 2012): injusto fracasso de bilheteria nos Estados Unidos, é daqueles filmes de ação feitos à moda antiga que, a despeito de um roteiro que é um amontoado de bobagens, acaba fazendo todo o sentido pela ótima execução. Para os veteranos, é no mínimo interessante um filme do gênero ambientado no mundo dos ciclistas (ainda mais quando Manhattan inteira serve de cenário para as perseguições e malabarismos em duas rodas). E Joseph Gordon-Levitt e Michael Shannon, recém saídos de duas franquias milionárias (Batman e Superman, respectivamente), estão no tom exagerado ideal para a quase nula pretensão do roteiro. Em muito contribui que o filme tenha sido dirigido pelo ex-roteirista (Jurassic Park, Missão Impossível, Homem-Aranha) David Koepp, que já demonstrara talento como diretor em Ecos do Além e Ghost Town - Um Espírito Atrás de Mim. Por ironia, as únicas cenas que não funcionam mesmo são aquelas que apelam para os efeitos digitais, que nesse caso resultam bizarras. Enquanto apela para os velhos e bons dublês, o filme desliza que é uma maravilha, principalmente se acompanhado de uma tonelada de pipocas. Em tempo: lembra muito o clássico oitentista Quicksilver - O Prazer de Ganhar (1986), com Kevin Bacon. Nota 7   
 114 - Room 237 (Room 237, 2012): excelente documentário que traz à tona nove teorias da conspiração de fãs em relação a O Iluminado, de Kubrick. O absurdo de algumas das analogias é adequadamente evidenciado pela opção em nunca revelar o rosto dos depoentes, o que dá ao filme uma dinâmica inversa de sonho que casa muito bem com a verborragia pesada dos comentários em off. Há insights bem sacados, como a óbvia referência ao extermínio de índios (já presente inclusive no livro de Stephen King), mas o que realmente diverte são os pitacos mais absurdos, como a conspiração sobre a encenada viagem da Apollo 11 à Lua e aos erros de continuidade, que são justificados das formas mais viajantes (e apaixonadas) possíveis. Divertido e imprescindível para cinéfilos, fãs de Kubrick ou não. Nota 8 
** 115 - X-Men: O Confronto Final (X-Men: The Last Stand, 2006): rever filmes que já não provocaram grande impacto na época sempre torna os defeitos mais evidentes, caso dessa equivocada terceira parte da trilogia mutante, aqui comandada pelo operário-padrão Brett Ratner (A Hora do Rush, Roubo Nas Alturas) que, sabe-se lá como, conseguiu o emprego do ótimo Bryan Singer, responsável pelos excelentes dois primeiros filmes e abandonou a função para dirigir Superman - O Retorno. Há equívocos básicos, como ir abandonando durante a trama personagens fundamentais (Ciclope, Xavier, Mística, Vampira) em prol de coadjuvantes que nunca dizem a que vieram e a um dos piores grupos de vilões já reunidos no cinema. E a batalha final, com uma bizarra opção por saltos obviamente comandados por cabos de aço (o que faz o filme por vezes parecer aquelas produções antigas de artes marciais) é, além de chata de doer, muito mal coreografada. Salvam-se Wolverine e Magneto, os dois pontos altos da franquia, principalmente o último, personificado por um sir Ian McKellen que faz questão de roubar todas as cenas para si. E a seqüência que envolve a reestruturação da Golden Gate é muito legal. Menos mal que o grupo mutante é tão carismático que o seu potencial se sobrepõe até mesmo a um roteiro com execução mediana. Mesmo com os erros, prende a atenção. Nota 6,5 
116 - Sem Perdão (Dead Man Down, 2013): estréia no cinema americano do diretor dinamarquês Niels Arden Oplev, do Millennium original (Os Homens Que Não Amavam As Mulheres) e que apenas confirma o talento do cineasta em dirigir bem o elenco (aqui capitaneado por Colin Farrell e Noomi Rapace, que formam um casal de mocinhos bem esforçado) e comandar bem uma trama genérica de suspense policial. Pena que quem pague o pato seja o elenco de apoio formado por atores talentosos como Terrence Howard, Isabelle Huppert, F. Murray Abraham e Armand Assante, todos eles relegados a personagens secundários que quase desaparecem dentro do cenário. E não há virtuosismo narrativo que consiga esconder a natureza totalmente sem lógica do roteiro, um emaranhado de clichês tão mal costurado que lá pelas tantas um personagem, em meio a um tiroteio e sem motivo aparente, resolve procurar uma tomada e ligar um laptop para descobrir o que há dentro de um cartão de memória. Para ver tomando cerveja em um dia nublado. Muita cerveja. E desde que haja muitas nuvens no céu. Nota 6
117 - Chamada de Emergência (The Call, 2013): até o momento em que aposta as fichas na relação à distância entre a operadora do 911 Halle Berry e a vítima Abigail Breslin (Pequena Miss Sunshine), funciona que é uma maravilha. O problema todo é quando o roteiro decide deixar de apostar nessa premissa e vira um grande (e imbecil) suspense para as massas, com direito ao mais idiota dos clímaces. Enquanto tem confiança no que é o seu maior trunfo, o filme até consegue convencer que é dirigido por Brad Anderson (O Operário, Expresso Transsiberiano). Depois disso, parece qualquer outra produção genérica feita para a TV. Diverte, mas passa só por média e olhe lá. Nota 6 
118 - Pietá (Pieta, 2012): canibalismo, incesto e mutilação. Para quem conseguir passar por essas três provas (nunca registradas de forma gráfica, mas sugeridas de maneira impiedosa), Pietá revela-se um dos grandes filmes do ano. Apesar da temática óbvia (escancarada já pelo título para aqueles que conseguem compreender ao quê exatamente se refere), é uma das obras mais fortes e poderosas a chegar nos cinemas em 2013. Por trás dessa sinfonia violenta, o diretor Kim Ki-duk (Primavera, Verão, Outono, Inverno e... Primavera) quer mais é discutir religiosidade e os efeitos nocivos do capitalismo selvagem nas camadas mais baixas da sociedade sul-coreana. E ter um protagonista que é a própria personificação do mal, mesmo quando encontra redenção, só ajuda. Que baita filme. Nota 8,5
119 - A Dançarina E O Ladrão (El Baile de La Victoria, 2009): Fernando Trueba é um veterano diretor espanhol que, em seus melhores momentos, entregou obras como Sedução (vencedor dos Kikitos de Melhor Roteiro, Melhor Ator Coadjuvante e Prêmio Especial do Júri no Festival de Gramado de 1993 e do Oscar de Filme Estrangeiro em 1994) e Chico & Rita (indicado ao Oscar de Melhor Animação em 2012). Por isso, é um tanto decepcionante constatar que esse A Dançarina E O Ladrão escorregue tanto na execução quanto no roteiro, inspirado em livro do grande Antonio Skármeta (O Carteiro E O Poeta). Aliás, a história nunca tira proveito das óbvias alusões à ditadura que o texto original escancara para serem trabalhadas. Dá até certa vergonha de algumas cenas marcadas por situações um tanto infantilóides e inverossímeis, principalmente aquelas protagonizadas pelo personagem principal, vivido por um tal de Abel Ayala, que passa o filme todo com um eterno sorriso apalermado, não importa o contexto em que o texto lhe coloque. Sobra a boa fotografia, que tira proveito das Cordilheiras chilenas para formar quadros belíssimos, uma e outra passagem bem encenada e a sempre impactante presença do excelente Ricardo Darín, que dá dignidade a qualquer produção. Se não fosse por Darín... Nota 5,5 
120 - O Homem da Máfia (Killing Them Softly, 2012): entre uma superprodução e outra, Brad Pitt, através de sua produtora Plan B, investe em filmes sem qualquer pretensão comercial, como esse Killing Them Softly, que ganhou um título genérico e picareta no Brasil para enganar o público que vai ao cinema em busca de diversão rasteira, atraído pelo nome do astro no cartaz. Longe de ser um filme de máfia convencional, O Homem da Máfia sequer é um filme de ação. Aliás, é a antítese de um filme de ação. Verborrágico e com raras, mas marcantes, explosões de violência aqui e ali, a praia da produção é bem outra. O que se pretende aqui é traçar um paralelo entre o corporativismo por trás da crise econômica americana de 2008 e o modus operandi da máfia ítalo-americana de Boston. Ao montar essa analogia esperta, o roteirista e diretor Andrew Dominik (do ótimo O Assassinato de Jesse James Pelo Covarde Robert Ford, também estrelado por Pitt) construiu um dos melhores registros em filme dos acontecimentos que levaram os EUA à bancarrota no final da década passada, colocando o filme lado a lado com os também sensacionais Margin Call - O Dia Antes do Fim e Grande Demais Para Quebrar (da HBO) como as melhores encenações sobre a última crise financeira americana feitos até o momento. O Homem da Máfia, entretanto, ganha pontos pela abordagem absolutamente original (e genial em alguns momentos). Todos os personagens da trama são personificações dos protagonistas reais da crise de 2008, sejam personalidades reais (como o interventor Henry Paulson, aqui na pele do matador encarregado de solucionar a crise no filme, um Brad Pitt irretocável), sejam instituições representadas por atores como James Gandolfini (que merecia pelo menos ter sido lembrado com uma indicação ao Oscar de Ator Coadjuvante), um assassino caído em desgraça que representa os primeiros bancos a falirem. Já o papel de narrador cabe ao próprio noticiário da época, ouvido ao fundo por meio de rádios e televisores que parecem sempre sintonizados ora nos discursos dos políticos (era época da campanha eleitoral que daria a Presidência a Obama) ora nos programas jornalísticos que cobriam a crise e que explicitamente transformam todas (TODAS) as cenas do filme em uma grande metáfora do que aconteceu aos EUA naquele ano. Escudado ainda por um senso de humor peculiar que em muitos momentos lembra o ritmo dos filmes dos irmãos Coen, O Homem da Máfia certamente vai desagradar quem busca um bom filme policial protagonizado por Pitt. Mas vai fazer a alegria daqueles que procuram algo mais do que o feijão com arroz de todos os dias. Para esses, O Homem da Máfia nunca vai ter esse título e sempre vai ser Killing Them Softly. Nota 8,5 
121 - Segredos de Sangue (Stoker, 2013): é uma prova de fogo para qualquer cineasta estrangeiro conseguir estrear em Hollywood sem vender a alma ao capeta dos grandes estúdios e abrir mão de qualquer traço autoral que lhe fizera a fama em projetos na terra natal. Felizmente, não é o que acontece com o sul-coreano Park Chan-wook, há muito tempo um dos diretores da nova geração que eu não canso de apontar como um dos maiores talentos em atividade hoje em dia (Mr. Vingança, Lady Vingança, Oldboy, Sede de Sangue), em seu primeiro projeto em solo ianque. Usando e abusando da estética primorosa que já virou sua marca registrada (cada fotograma do filme parece pronto para ser emoldurado e exibido em uma galeria de arte), Park Chan-wook consegue imprimir identidade própria no que nas mãos erradas seria fadado a virar um folhetim destinado à televisão. Os temas preferidos do diretor (a violência como reflexo de uma tensão sexual permanentemente latente, o núcleo familiar que esconde segredos) estão presentes no apenas regular roteiro escrito pelo ator Wentworth Miller, o Michael Scofield do seriado Prison Break. Mas Park Chan-wook consegue valorizar os pontos altos da trama, ao passo que é hábil em disfarçar os defeitos mais óbvios através de seu virtuosismo plástico. E a trinca de protagonistas, que conta com Mia Wasikowska, a Alice de Tim Burton, Matthew Goode (Watchmen - O Filme) e Nicole Kidman (linda, apesar das plásticas mal-feitas, e fotografada pelo diretor com a evidente intenção de aproximar a sua imagem das divas loiras imortalizadas por Hitchcock), está convincente. Como turista, Park Chan-wook fez um belo registro no cinemão americano. Resta saber se vão lhe conceder o visto de residente. Nota 8
* 122 - Círculo de Fogo (Pacific Rim, 2013): o cinema comercial americano vive uma inegável crise de criatividade já há alguns anos e a tonelada de lançamentos que prefere o caminho fácil das seqüências, refilmagens, reboots ou adaptações de quadrinhos, livros e qualquer outra fonte pop só escancara o fato. Guillermo Del Toro (O Labirinto do Fauno, Hellboy), diretor mexicano que cresceu com o cinema de entretenimento de qualidade dos anos 70/80, resolveu dar o troco e deixar Michael Bay, seus Transformers e suas réplicas, se é que viram Pacific Rim, com uma baita vergonha de seu currículo. O que Del Toro faz aqui pelos antigos filmes japoneses "kaiju eiga" (os filmes de monstros que destruíram Tóquio um sem número de vezes durante a infância de muitos) deveria ser obrigatório para qualquer um que se aventure a homenagear um gênero ou produto, qualquer que seja. Preocupado em dar à premissa absurda do mundo povoado por monstros gigantescos que prefere investir em robôs colossais para combatê-los, o diretor construiu um verdadeiro microcosmo de referências ao gênero, dos cenários à música e deles às coreografias das lutas. Ah, as lutas... Elas botam no chinelo não só a franquia Transformers, como também os últimos 40 minutos de Homem de Aço e Os Vingadores e trocentas outras produções que tornaram a orgia dos efeitos em computação gráfica praticamente um videogame projetado nas telas de cinema. Combinando efeitos práticos, enormes cenários e muita maquiagem (características, aliás, de toda a filmografia de Guillermo), os efeitos digitais parecem se fundir ao que é de fato real em cena. Por isso, Pacific Rim também é uma lição de casa a ser aprendida por quem utiliza os computadores para tapear a própria inaptidão para o cinema (sim, Michael Bay, estou falando com você e seus imitadores). Del Toro sabe criar o clima, dar o real sentido de dimensão entre os elementos que constroem as cenas, construir lentamente a história e, por isso mesmo, quando os momentos de extravasamento chegam (claro, quem não ficaria esperando por batalhas épicas entre monstros e robôs gigantes?), eles realmente empolgam (e note-se como não precisam se tornar intermináveis para surtir o efeito pretendido). A sensação de peso a cada prédio destruído em cena é quase palatável (e um prazer extra é ver a reação do público quando isso acontece). A diferença entre Pacific Rim e qualquer outro enlatado americano reside na preocupação em entregar um roteiro com situações e personagens com que o público facilmente se identifica (e, por isso, torce loucamente, mesmo sabendo de antemão como o filme provavelmente terminará). Matinê como aquelas que povoaram a minha infância, desperta o piá de 13 anos que vive escondido dentro de qualquer um, independentemente de idade ou sexo. Se eu fosse o Michael Bay, estaria chorando em posição fetal num canto de sua mansão em Beverly Hills. Nota 8,5     
123 - Would You Rather (Would You Rather, 2012): a franquia Jogos Mortais e o cineasta Eli Roth e seus dois O Albergue foram responsáveis ao mesmo tempo por popularizar e esgotar a fórmula que ficou conhecida como torture porn, aqueles filmes de terror que, no lugar de sustos, investem em cenas chocantes e muitas vezes gratuitas de violência e tortura. Menos mal que essa mistura assumida das duas franquias citadas acima preserva o caráter sádico do gênero, mas abre mão do componente que transformava o público em masoquista: o desleixo narrativo. Amparado por uma direção correta mesmo sem ser brilhante, atores de segunda categoria que pelo menos nunca comprometem e um desfecho bem sacado, é daqueles filmes ruins que resultam em bom divertimento. E nem é tão violento assim, deixando as cenas mais pesadas apenas na sugestão. O elenco, povoado por figuraças que quase sempre posam como coadjuvantes, traz rostos conhecidos como Brittany Snow (A Escolha Perfeita, Hairspray), a ex-atriz pornô Sasha Grey (Confissões de Uma Garota de Programa), John Heard (o pai de Kevin em Esqueceram de Mim) e Eddie Steeples (o Crabman do seriado My Name Is Earl). Mas quem rouba a cena é Jeffrey Combs (Re-Animator), esbanjando tanta canastrice que chega a ser brilhante. Nota 7      
124 - Quando Me Apaixono (Then She Found Me, 2007): a estréia como diretora da atriz Helen Hunt revela uma realizadora com certa sensibilidade. Reconhecida no cinema injustamente por seus papéis de par romântico dos protagonistas (Melhor É Impossível, Do Que As Mulheres Gostam, Twister), é irônico que a personagem principal de seu primeiro filme seja justamente uma dessas figuras periféricas, eternamente destinadas a fazer escada para machos-alfa, o que o roteiro trata de desconstruir já nas primeiras cenas. O maior equívoco aqui é a indecisão entre entregar uma comédia romântica padrão, um drama sobre uma mulher que não consegue engravidar ou uma dramédia sobre o encontro de uma filha adotiva com sua mãe biológica (uma divertida Bette Midler). Essa dicotomia está escancarada desde a comparação entre o título nacional (que aposta na comédia romântica) e o título original (que refere-se justamente ao encontro de mãe e filha). Por trás dessa confusão narrativa, porém, há um elenco de respeito (além de Midler e Hunt, Matthew Broderick e Colin Firth dão as caras e todos estão muito bem). Como primeira tentativa atrás das câmeras de Hunt, se não chega a empolgar, pelo menos nunca incomoda. Vale uma espiadela. Nota 6,5 
125 - O Último Exorcismo - Parte 2 (The Last Exorcism Part II, 2013): o primeiro O Último Exorcismo (ou seria o penúltimo exorcismo, dada a completa falta de lógica em denominar esse como "o último-parte 2"?) representou certo sopro de criatividade dentro do já batido gênero dos filmes de "found footages" (filmagens encontradas), com o comentário irônico que lançava sobre os falsos investigadores de fenômenos paranormais. Tinha pelo menos um personagem bem construído (o pastor que perdeu a fé e abraçava a racionalidade em vez da crença no sobrenatural) e um clima crescente de terror que era eficaz dentro de sua proposta. Essa continuação abandona a técnica da câmera na mão (seu primeiro erro) e aposta em um filme de horror convencional, colocando a endemoniada do primeiro filme em um ambiente urbano (outro equívoco). Apesar de começar razoavelmente bem, a trama vai gradualmente descambando para os mais surrados clichês do gênero (quem ainda agüenta a aparentemente obrigatória cena dos corvos que se atiram contra janelas?) até entregar o maior anticlímax do ano até agora. E o pior pecado: não mete medo nem em criança com menos de 10 anos. Vade retro. Nota 3 
126 - Ferrugem e Osso (De Rouille Et D´Os, 2012): tão certo quanto o Oscar e o Natal é o fato de que todo ano pinta nas telas aquela produção francesa que esfrega na cara de Hollywood que é possível fazer drama popular de qualidade, sem cair no manual telegrafado de roteiro imposto pelos grandes estúdios americanos. Ferrugem e Osso é até aqui o longa da vez vindo da terra de Sarkozy a ganhar uma chance no circuitão brasileiro. Dirigido pelo excelente Jacques Audiard (do ótimo O Profeta), entrega uma história tocante amparada no relacionamento entre dois personagens (aparentemente tão incompatíveis quanto a ferrugem e o osso, como esclarece o título) defendidos de forma surpreendente por Matthias Schoenaerts e Marion Cotillard, ambos sensacionais em cena. Sem nunca resvalar nos lugares-comuns do dramalhão, Ferrugem e Osso surpreende pela sinceridade com que fala de perdas e reconquistas, das agruras do cotidiano e principalmente das contradições que existem na personalidade de todo ser humano. É de certa forma um filme de superação às avessas, que não esconde sob o tapete toda a crueza da realidade, como os contos de fada que tanto agradam a nova geração. Conta com uma trilha sonora irrepreensível (assim como a de O Profeta, aliás) e uma fotografia linda, daquelas que estão ali para ajudar na construção narrativa, mas nunca sobrepor-se a esta. Grande filme. Nota 9
127 - Abraços Partidos (Los Abrazos Rotos, 2009): tido na época do lançamento como um Almodóvar "menor", na verdade não tem nada de pequeno. É, sim, o mais despudorado (para o bem ou para o mal) novelão que o espanhol já realizou, com direito a paternidade escondida, adultério nas altas rodas da sociedade madrilense e personagem sendo jogado escadaria abaixo. Algumas situações são tão irreais quanto o capítulo do dia da novela das 8, mas Almodóvar conduz tudo com mão firme, piscando o olho para o público (o filme dentro do filme, por exemplo, é uma réplica perfeita de suas primeiras comédias). E a métrica estética empregada pelo cineasta (uma constante dentro dessa fase madura que vem desde Tudo Sobre Minha Mãe) faz cada cena apresentar um quadro milimetricamente equacionado, desde a paleta de cores vibrantes até a cenografia espantosa. Mas quem ilumina mesmo a produção é uma Penélope Cruz deslumbrante que parece incorporar o seu perfil de diva na direção de arte do filme. Só por ela Abraços Partidos já não mereceria ser lembrado como um trabalho menor de Almodóvar. Mas não é só. Nota 8 
128 - Você Não Conhece Jack (You Don´t Know Jack, 2010): o que mais impressiona é a disposição da HBO em lançar um filme tão assumidamente pró-eutanásia, o que certamente deve ter provocado faniquitos na parcela de republicanos de sua audiência. Só por abraçar sem medo a bandeira da liberdade de escolha, o filme de Barry Levinson (Rain Man, Mera Coincidência) já merecia uma chance. A biografia do chamado Dr. Morte (Jack Kevorkian), que insistia em enfrentar a Suprema Corte americana ao advogar o seu direito de auxiliar no abreviamento da vida de pacientes terminais é um manifesto dos próprios realizadores sobre o tema. Por outro lado, com um elenco excelente que reúne em papéis coadjuvantes John Goodman, Susan Sarandon e Danny Huston, fica difícil não simpatizar com o protagonista, um sensacional Al Pacino, que levou com justiça o Globo de Ouro 2011 de Melhor Ator em Filme ou Minissérie para a TV.  Seria legal se Brenda Vaccaro (Perdidos Na Noite) tivesse pelo menos concorrido como coadjuvante. Nota 7,5 
129 - Sem Dor, Sem Ganho (Pain & Gain, 2013): o diretor Michael Bay, deixando de lado a orgia de efeitos digitais que pauta a maioria de seu currículo, curiosamente tenta apresentar aqui uma produção “menor”, sem grande orçamento ou explosões. Inspirado por uma série de reportagens publicadas na revista americana Variety, retrata a inacreditável história real de uma gangue de fisiculturistas que, em meados dos anos 90, resolveu sequestrar um figurão de Miami e extorquir-lhe todo o dinheiro. Porém, como já era de se esperar, a massa bruta dos sujeitos era inversamente proporcional à sua inteligência, o que engatilha uma espiral de equívocos, violência e mortes. Escorado no bom material original, Bay consegue entregar um de seus filmes mais interessantes, uma tentativa sincera de apresentar uma crítica ácida à busca irresponsável pelo sonho americano. Os protagonistas Mark Wahlberg e The Rock estão muito à vontade como os marombados com cérebro de ervilha e a disposição dos astros em rir de suas próprias personas cinematográficas rende momentos genuinamente divertidos. Pena que "uma vez Michael Bay, sempre Michael Bay". E os cacoetes irritantes do cineasta insistem em aparecer, seja na abordagem sexista das personagens femininas, no excesso de firulas narrativas (a fotografia do filme é tão irreal que parece toda pintada no computador para se parecer com um daqueles comerciais de margarina cafonas) e na duração extenuante, que conta com no mínimo 30 minutos a mais do que seria ideal. É muito melhor que a franquia Transformers, mas ainda há um longo caminho a ser percorrido para que Bay entregue um produto de qualidade inegável. Aqui, passa por média. O que, no seu caso, já é motivo de comemoração. Nota 6,5
* 130 - Muito Barulho Por Nada (Much Ado About Nothing, 2012): rodado em segredo por Joss Whedon nos intervalos das filmagens de Os Vingadores, essa adaptação da peça homônima de Shakespeare é um projeto antigo do cineasta, que rodou o filme entre amigos (a maioria atores de seriados ou filmes dirigidos pelo diretor) em seu próprio casarão em Malibu durante apenas 12 dias. Os primeiros 10 minutos são excruciantes e um convite a abandonar a sala de cinema, tanto pela opção em preservar o texto de Shakespeare em contraste com a ambientação moderninha, quanto pela discutível opção em rodar o longa em preto e branco (não há sequer um cuidado especial com a fotografia), algo que destoa da ambientação solar original da peça (algo aproveitado muito bem na superior versão de Kenneth Branagh em 1993). Quando a trama de intrigas amorosas e casais a serem juntados fica clara, o filme decola, apesar de alguns maneirismos de Whedon, como a câmera inclinada em momentos inapropriados (o que já fizera em Os Vingadores) às vezes truncar desnecessariamente a fruição. Conta com uma trilha legal e um elenco o.k., com destaque para Amy Acker e Alexis Denisof (ambos do seriado Angel: O Caça-Vampiros, criado por Whedon), que encarnam o casal mais simpático da peça. Na verdade, o texto de Shakespeare é tão bom que fica difícil errar. E essa versão transposta para a burguesia de Los Angeles (no lugar da fidalguia italiana da peça original) até que funciona bem, apesar de não arranhar a excelência da grande adaptação de 1993, que além da fotografia belíssima, ainda contava com um elenco estelar (Branagh, Emma Thompson, Denzel Washington, Keanu Reeves, Kate Beckinsale, Imelda Staunton, Robert Sean Leonard e Michael Keaton). Nota 7 
 * 131 - Frances Ha (Frances Ha, 2012): fazia tempo que não pintava nas telas um filme com tanto potencial para virar cult entre uma parcela do público (eu, inclusive). Guiado totalmente por uma personagem única, maluca, desengonçada, contraditória e, por isso mesmo, adorável, Frances Ha é daqueles filmes que, quando conquistam alguém, vão direto para a cabeceira de qualquer cinéfilo. O diretor Noah Baumbach já demonstra talento desde o comecinho dos anos 90 (são dele Kicking And Screaming, Mr. Jealousy, A Lula E A Baleia e Margot E O Casamento) com suas comédias agridoces e, ao que tudo indica, o cara está ficando cada vez melhor com o passar do tempo. Nesse roteiro co-escrito com a protagonista Greta Gerwig, o cineasta faz um estudo de personagem que dificilmente encontra paralelo na cinematografia recente. Editado com inteligência, fazendo exemplar uso da sensacional fotografia em preto e branco, com diálogos afiados e personagens marcantes, Baumbach parece aqui, mais  do que nunca, uma espécie de Woody Allen às avessas, com toda a verborragia, mas sem as neuroses (e a fotografia, como não poderia deixar de ser, lembra escancaradamente Manhattan e Memórias, de Woody). É muito difícil sair imune de Frances Ha quando, na última cena, revela-se o motivo do título, algo que, dentro de sua simplicidade, encontra sentido em tudo o que se viu até ali. Fora que Modern Love, de David Bowie, vai ficar ecoando por um bom tempo na cabeça de todos, o que por si só já é motivo de aplausos. E torcer por Frances Ha, mesmo com todas as adversidades impostas pelo roteiro (e pela vida de todos nós) não é só conseqüência da ótima condução do filme. Chama-se a isso de humanidade. Recomendação total. Nota 9
132 - Onde O Amor Está! (Country Strong, 2010): apesar de revelar uma ambientação decente dos bastidores dos cantores country revelados por Nashville, não define muito bem onde quer chegar. E não chega a lugar algum. É visível o esforço de Gwyneth Paltrow em entregar uma boa performance tanto como atriz como quanto cantora. Também é de se destacar que Garrett Hedlund (Tron: O Legado, On The Road) tem o timbre perfeito para canções country. O problema é que o roteiro nunca diga a que veio e não faz com que o público se importe com o destino de nenhum dos personagens, nem mesmo com o passarinho que bizarramente é criado dentro de uma caixa de madeira e subitamente desaparece lá pelas tantas. Uma perda enorme de tempo (e de tímpanos, considerando a falta de qualidade das músicas que, sabe-se lá como, conseguiram indicações para prêmios importantes). Nota 4  
133 - Raul - O Início, O Fim E O Meio (2012): Walter Carvalho é de longe o melhor diretor de fotografia do cinema brasileiro (são dele trabalhos visuais irretocáveis como aqueles apresentados em Central do Brasil, Madame Satã, Amarelo Manga e Heleno). Mas Carvalho também está revelando-se um diretor de mão cheia, o que esse documentário fantástico comprova depois de suas incursões anteriores (Cazuza - O Tempo Não Pára e Budapeste). Retratar o mito Raul Seixas sempre foi uma daquelas tarefas que afastava todo e qualquer produtor que se aventurasse a dramatizar a vida de um ícone do rock que possuía tantas facetas que, à primeira vista, seriam impossíveis de ser condensadas em um filme de apenas duas horas. Pois Carvalho foi lá e fez. Raul - O Início, O Fim E O Meio não só dá conta de abordar todas as inúmeras camadas de um personagem genial, como traz momentos que já se tornam automaticamente antológicos, como a entrevista com o dentista do cantor e a interação de Paulo Coelho com uma mosca em dado momento. Sem nunca pender para o fácil caminho da reverência fanática, é um daqueles documentários que parecem definitivos e conseguem desvelar tanto o personagem quanto o ser humano por trás dele. Um dos melhores documentários dos últimos anos. Imprescindível para fãs, não-fãs e interessados por música ou mesmo pela História do Brasil. Depois de assistir a esse filme sensacional, talvez nasça um bordão adicional para acompanhar aquele que todos conhecem: "Veja Raul". Nota 9  
134 - Em Transe (Trance, 2013): suspense que traz toda a pirotecnia visual que é habitual na filmografia do diretor Danny Boyle (Quem Quer Ser Um Milionário, 127 Horas). Além disso, conta com um elenco competente e soluções narrativas bem vindas, principalmente na desconstrução da narrativa padrão ao embaralhar os momentos de transe do protagonista com o que realmente está acontecendo na trama. Porém, é um roteiro que pensa que é muito mais esperto do que realmente é. Assim, quando a reviravolta final chega, não é tão surpreendente ao ponto de nos fazer esquecer dos imensos furos deixados pelo caminho até chegar ali. De hipnótica mesmo, só a depilação à brasileira de Rosario Dawson. Nota 5
 135 - Oz: Mágico e Poderoso (Oz The Great And Powerful, 2013): fantasia que iria se beneficiar enormemente de uma dose de efeitos especiais práticos e de maquiagem para funcionar melhor. Na realidade, na maior parte do tempo a sensação é de que se está assistindo a alguma animação da Disney, tamanha é a quantidade de CGI que circunda o protagonista (um canastríssimo James Franco). O excesso de efeitos digitais afasta a produção do clássico (imensamente superior, obviamente, de 1939), mas não tira de todo o seu encanto. Os alívios cômicos (a boneca de porcelana e o macaquinho voador que acompanham o protagonista) são muito simpáticos e o roteiro é cheio de referências ao Mágico de Oz original. Diverte na medida e, mesmo que seja um estranho no ninho na filmografia de Sam Raimi (A Morte do Demônio e a primeira trilogia do Homem-Aranha), ainda assim está longe de representar uma mancha em sua carreira. Entretenimento ao menos sincero. Nota 6,5  
136 - Quase Um Anjo - Bernie (Bernie, 2011): Richard Linklater (Antes da Meia-Noite) é um dos melhores diretores vindos da safra dos anos 90 e aqui confirma a boa mão com a repetição da parceria com o comediante Jack Black depois de Escola do Rock. Inspirado em fatos surrealmente reais, é a história de um personagem que, à primeira vista, teria tudo para causar asco no público, mas que, através dos ótimos roteiro e direção, torna-se um personagem adorável, muito porque Jack Black entrega a atuação de sua vida até aqui, um misto de ingenuidade e passividade que é muito difícil de atingir. Matthew McConaughey também está ótimo como um promotor tão implacável quanto midiático. Um trabalho de qualidade que possivelmente passe injustamente despercebido do público por causa do esdrúxulo título nacional. Uma pena. É um filme e tanto.. Nota 8
* 137 - Invocação do Mal (The Conjuring, 2013): filme de terror feito à moda antiga que comprova que o diretor malaio James Wan (Sobrenatural) entende do riscado, pelo menos no que compete ao gênero em questão. Praticamente não se usa qualquer efeito digital nesse eficiente filme de casa mal-assombrada, o que, por si só, já é um trunfo. Mas o diretor também é esperto o suficiente para desviar dos sustos-clichês habituais e investir em uma permanente atmosfera de apreensão que funciona tão bem que até o público barulhento dos cineplexes acaba silenciando, apreensivo com o que a próxima cena lhe reserva. Bem dirigido, bem roteirizado e muito bem defendido por um elenco competente, é daqueles filmes de terror que encantam pela eficácia. Nada que vá revolucionar o cinema, mas algo que indiscutivelmente cumpre com o seu objetivo: meter medo de verdade. Nota 7,5 
* 138 - Rush - No Limite da Emoção (Rush, 2013): é fenômeno raro, mas o cinema produzido em Hollywood ainda consegue entregar vez ou outra algumas produções que, sem desviar do padrão americano de fazer cinema, resultam em filmes de qualidade inegável. Rush, dirigido pelo hollywoodiano Ron Howard (Cocoon, Frost/Nixon, O Código DaVinci), é um desses casos. Aliás, Rush faz pelo automobilismo algo que desde o clássico Grand Prix, de John Frankenheimer, não se via nas telas: uma história que nunca deixa de lado o caráter humano de seus personagens e mesmo assim consegue aproveitar ao máximo a adrenalina intrínseca das corridas de Fórmula 1. A trama, que retrata a rivalidade entre o inglês James Hunt (um competente Chris Hemsworth, o Thor da Marvel Studios) e o austríaco Niki Lauda (um sensacional Daniel Brühl, de Bastardos Inglórios e Adeus, Lênin) durante as temporadas de F1 em meados da década de 70, apesar de arredondada sob medida para o grande público, conta com um roteiro muito eficaz, que consegue aproveitar ao máximo tanto a relação de amor e ódio entre os personagens quanto toda a adrenalina que envolve os bastidores e as próprias corridas nos grandes prêmios ao redor do mundo. Ron Howard, por sua vez, aproveita muito bem as ferramentas que dispõe, principalmente as impecáveis fotografia e trilha sonora (do mestre Hans Zimmer), que amplificam as emoções durante os embates sobre quatro rodas, com acordes certeiros e tomadas incríveis que muitas vezes transportam o público para dentro do cockpit dos veículos. E apesar da campanha de marketing e da própria estrutura do roteiro apontarem para um leve protagonismo do personagem britânico (manobra que tem o claro intuito de aproveitar a popularidade do galã Hemsworth junto ao público jovem), é mesmo Daniel Brühl e seu ótimo Niki Lauda que roubam o filme para si. Muito gradualmente, Lauda se torna o real protagonista da produção, tanto pela impecável atuação de Brühl quanto pela incrível jornada de superação do personagem. Cinemão comercial de inquestionável qualidade. Já garantiu inclusive lugar privilegiado no grid de largada na competição dos melhores do ano. Nota 9  
139 - Tropicália (2012): documentário conduzido com criatividade e muita ênfase na música produzida no período pelo movimento tropicalista, o que o torna praticamente um musical. Aprofunda pouco a interação entre a tropicália musical com as demais manifestações artísticas que seguiram a mesma estética (são abordados basicamente o cinema de Glauber Rocha e o teatro de Zé Celso Martinez), mas há depoimentos e cenas antológicas dos principais nomes do tropicalismo, principalmente Arnaldo Baptista, Sérgio Dias e Tom Zé, este responsável pelo momento mais divertido do filme. Do meio pro fim, acaba focando muito em Caetano e Gil, mas é justamente com eles a cena mais emocionante do longa, reservada para o finalzinho. Nota 7,5
* 140 - Dose Dupla (2 Guns, 2013): Denzel Washington e Mark Wahlberg (repetindo a mesma atuação que entregara em Ted, no ano passado) formam uma dupla simpática e até conseguem divertir em alguns momentos, mas o longa do diretor islandês Baltasar Kormákur (de Contrabando, também com Wahlberg) não tem um roteiro que consiga remotamente acertar a tentativa desesperada de emular o clima dos "buddy cop movies" dos anos 80. As piadinhas são requentadas e quase nunca funcionam, o elenco coadjuvante é cheio de nomes conhecidos (Paula Patton, Bill Paxton, Edward James Olmos, James Marsden) que não conseguem entregar nada além de caricaturas e, o pior de tudo, as cenas de ação são tão frouxas que não há sequer aquele momento catártico capaz de absolver os pecados da produção. Diverte muito medianamente e, por isso mesmo, merece uma visita só quando chegar às locadoras. Não há pipoca que justifique a ida ao cinema. Nota 5 
141 - Ritos da Primavera (Rites Of Spring, 2011): a premissa de juntar uma trama policial de seqüestro com outra clássica de terror (no caso, um slasher movie) é até legal (Um Drink No Inferno fez isso com maestria), mas só o que os realizadores conseguem fazer é empilhar os chavões mais rasteiros dos dois gêneros. O resultado, como não poderia deixar de ser, é um produto duplamente genérico. E por isso mesmo ruim de dar dó. Nota 3 
142 - Branca de Neve (Blancanieves, 2012): sensacional adaptação da fábula para o mundo das touradas, em preto e branco e ainda por cima mudo. O que o diretor Pablo Berger (do divertido Da Cama Para A Fama) faz aqui ao despir o longa de cor e diálogos é uma ode à narrativa clássica, um retorno a um tempo em que o que mais importava era a boa história a ser contada. Engenhoso e com uma fotografia de cair o queixo, Blancanieves ainda conta com uma das direções de arte mais impressionantes do ano e que consegue o feito de reverenciar tanto o impressionismo alemão (nas cenas da casa da madrasta) quanto o neorrealismo italiano (nas cenas dos anões toureiros). Como se não bastasse, ainda consegue unir em cena duas beldades cujos rostos são cinematográficos sob qualquer cor ou fotografia: a novata Macarena García e a quarentona Maribel Verdú (E Sua Mãe Também, O Labirinto do Fauno). Um dos filmes mais interessantes que passaram pelos cinemas brasileiros em 2013. Nota 9 
* 143 - Elysium (Elysium, 2013): o sul-africano Neil Blomkamp já mostrara que tinha ótima mão para misturar em uma mesma panela ficção científica e crítica social com o ótimo Distrito 9 (2009), que lhe escancarou as portas de Hollywood. Elysium segue receita idêntica a do filme anterior, mas desta vez com orçamento inchado e direito a elenco estelar (Matt Damon, Jodie Foster e Sharlto Copley, protagonista de Distrito 9, são os primeiros nomes dos créditos). De certa forma, Elysium desaponta um pouco por nunca conseguir equiparar-se a Distrito 9 no que diz respeito a harmonização dos ingredientes. Em Elysium, há uma divisão clara entre primeiro e segundo atos. Na primeira metade, o filme é irrepreensível: apresenta um protagonista de fácil empatia, vilões detestáveis e uma nova ordem social que divide a raça humana entre os miseráveis que ainda habitam o planeta Terra (na maioria, latinos) e os endinheirados que orbitam nossa atmosfera no satélite-resort que dá nome ao filme. Porém, do meio para o fim, Blomkamp se rende ao espetáculo hollywoodiano, entregando um filme pipoca (muito eficiente, diga-se de passagem) que lança mão tanto do aparato tecnológico garantido pelos grandes estúdios quanto de certos clichês batidos do gênero. Para os brasileiros, há dois motivos adicionais que valem a ida ao cinema: Alice Braga e Wagner Moura. Enquanto Alice faz bem a personagem da mocinha-padrão das super-produções, o personagem amoral de Wagner Moura entra de mansinho na história e ganha força no último ato, terminando o filme como o segundo maior personagem masculino do filme. Estréia respeitável essa de Wagner Moura, que aproveita muito bem as muitas cenas que ganha de Blomkamp. Já com Jodie Foster acontece o inverso: apresentada como a grande vilã no começo, a atriz ganha um personagem chinfrim que, aos poucos, vai sendo soterrado em um mar de clichês até que, lá pelas tantas, desaparece de cena sem deixar saudades. Apesar do evidente declínio temático da metade para o fim, Elysium ainda é daqueles programões imperdíveis. Na pior das hipóteses, uma ficção que honra o gênero com uma história original e um ritmo adequado. De qualquer forma, um filme que propõe discussões sociais tão relevantes em sua premissa (e que encontram analogia até mesmo dentro do mundo do cinema: não seria Blomkamp um desses outsiders que tenta invadir a Elysium hollywoodiana?) merece ser visto mesmo quando o resultado é ruim. O que não é nem de longe o caso aqui. Ótima pedida. Nota 8
 144 - Uma História de Amor e Fúria (2013): produto raríssimo (uma animação brasileira para adultos), Uma HIstória de Amor e Fúria consegue a proeza de dar uma aula de História bacana ao incluir no roteiro transições de época que vão desde o massacre dos índios tupinambás em Guanabara, lá pelos 1500 e poucos, passando pela Baianada maranhense até o período da ditadura Militar (entre as décadas de 60 e 80), sempre adotando a visão dos oprimidos e não daqueles tratados como heróis pela bibliografia. O personagem, aparentemente imortal, presencia todos esses eventos em busca de sua amada, que reencarna de tempos em tempos, até a narrativa ir parar no futuro brasileiro, no distópico ano de 2096, quando a narrativa vai ganhar o seu clímax. Como documento de revisionismo da História acadêmica, é um prato cheio para virar daqueles filmes obrigatórios para ser exibidos aos estudantes do Ensino Médio. Já como cinema, apesar das ótimas intenções, o longa tem lá seus altos e baixos. Enquanto a animação é fantástica no segmento destinado ao futuro (disparado a melhor coisa do filme), o mesmo não pode ser dito sobre a técnica empregada nos outros períodos históricos retratados, que parecem desenhos da década de 80 pela movimentação rudimentar dos personagens. O roteiro também é um pouco óbvio demais, o que de certa forma é atenuado pelo excelente uso das vozes de Selton Mello, Camila Pitanga e Rodrigo Santoro, todos muito bem. Vale conferir. Nota 7  
145 - Rammbock (Rammbock, 2010): curiosa variação dos filmes de zumbis feita na Alemanha, com poucos recursos e muita criatividade. Enquanto toma a liberdade de filiar-se ao subgênero dos zumbis velozes, ao mesmo tempo apresenta um retorno ao clássico modelo das produções de George Romero ao ambientar toda a trama em um único microcosmo social (um prédio no subúrbio de Berlim). Enxuto em sua duração (só uma horinha), apresenta um final original e inesperado. Nota 7,5
146 - Frank e o Robô (Robot & Frank, 2012): irresistível comédia dramática de ficção científica que traz Frank Langella em uma inspirada atuação como um ladrão aposentado que sofre de problemas de memória e é obrigado a conviver com um robô-mordomo que, aos poucos, vira seu cúmplice em um último golpe. O elenco de apoio é ótimo: Liv Tyler, Susan Sarandon, James Marsden e a voz de Peter Sarsgaard. Engraçado, tocante e inesperado, é um desses tesouros escondidos nas locadoras que mereciam muito mais sucesso do que conseguiram em sua breve passagem no cinema. Nota 8,5
*147 - O Tempo e o Vento (2013):  é curiosa a recepção calorosa do público do Sul a essa nova adaptação do clássico de Érico Veríssimo. As reações entusiasmadas da platéia dizem muito mais respeito a um gauchismo orgulhoso em ver parte de sua História na tela do que propriamente às qualidades da superprodução comandada pelo limitado Jayme Monjardim. Ironicamente, outros longas com muito mais identidade gaudéria (Anahy de las Missiones, Netto Perde Sua Alma) passaram de certa forma batidos pelos cinemas e não angariaram tanta repercussão positiva do público fora dos circuitos alternativos de exibição. Prova de que o padrão Globo de produção subverteu o limite imposto pela telinha e já invadiu o cinemão produzido no Brasil para as massas, para o bem e para o mal. De qualquer forma, O Tempo e o Vento não é um filme ruim. Na verdade, funciona como espetáculo visual sem nenhuma pretensão autoral, desses a que se assiste sem interferir na roda de mate. Nesse ponto, parece uma extensão das minisséries produzidas pela Globo na televisão, principalmente A Casa das Sete Mulheres, com sua direção de arte limpinha que parece transformar a Guerra dos Farrapos no habitat natural para os galãs televisivos. Todos os problemas aqui não residem no roteiro escrito a quatro mãos por Letícia Wierzchowski e Tabajara Ruas, que se esforça em manter a fidelidade ao material que lhe serve de base, mas sim a algumas escolhas equivocadas de Monjardim, a começar pelo confuso corte final, que torna certas passagens importantes do livro episódicas e mal exploradas (até mesmo o segmento reservado a Ana Terra e Pedro Missioneiro, que conta com uma aparição relâmpago e sem qualquer justificativa do grande César Troncoso, de O Banheiro do Papa). Outro problema grave é a trilha sonora. Além de totalmente genérica, sem utilizar qualquer elemento da música dos pampas, ainda é intrusiva demais, pontuando toda e qualquer cena até o ponto de tornar-se insuportável, mesmo defeito da estréia de Monjardim no cinema (Olga). A fotografia de Affonso Beato (Carne Trêmula, A Rainha) reverencia o cinema de John Ford e é muito feliz ao extrair o máximo de cores das paisagens do Sul, mas o excesso de cenas em contraluz com personagens galopando ou mirando o infinito no pôr-do-Sol, lá pela metade final, vira um cacoete desnecessário. As cenas de ação são bem coreografadas e há pelo menos duas ótimas atuações no longa: Fernanda Montenegro tira de letra o papel de Bibiana na velhice e o habitualmente execrável Thiago Lacerda acerta no tom de seu Capitão Rodrigo, conseguindo equilibrar muito bem a sua personalidade com a óbvia homenagem à icônica interpretação de Tarcísio Meira na minissérie global dos anos 80 (são dele as melhores cenas do filme). No final das contas, é uma produção que passa por média, mas nem de longe faz jus à obra imortal de Veríssimo. Mas é sempre bom ver o RS representado com pompa na telona. Nem que para isso tenhamos que aguentar a opção ridícula de Monjardim em encerrar o longa com uma música cantada em inglês e que não carrega nem um pingo do gauchismo retratado pelo roteiro. Nota 6,5  
148 - Marley (Marley, 2012): sensacional documentário que entrega a versão biográfica definitiva até aqui sobre o mito Bob Marley. O diretor Kevin Macdonald (dos excelentes O Último Rei da Escócia e Intrigas do Estado) fez um belo trabalho de pesquisa, mesclando depoimentos com um acervo fantástico de imagens raras. O filme não funciona apenas como cinebiografia, mas também como um importante documento de época, que enfoca não só a história sócio-política da Jamaica como também desvenda para os leigos os princípios e a dogmática da religião Rastafari. O registro aqui é tão acurado que dá prá sentir o cheiro do esgoto a céu aberto da favela de Trenchtown, onde se criou Marley. É filmaço para ver, rever e não parar de entoar os refrões de Bob. Grande músico, grande personagem, grande filme. Nota 9 
149 - 2 Dias em Nova York (2 Days In New York, 2012): quinto filme dirigido pela ainda bela Julie Delpy (Antes do Amanhecer), é a continuação direta de 2 Dias em Paris, também comandado por ela. Ao contrário do primeiro filme, que era bobinho, mas simpático, essa segunda parte, além de desnecessária, é um balde de água gelada para os cinéfilos que se encantaram por Julie ainda em 2013 com Antes do Pôr-do-Sol, um dos melhores filmes do ano até aqui. Demonstrando uma pretensão evidente em se tornar a versão francesa de Woody Allen, a diretora toma emprestado dele até a sua cidade-fetiche, além de permear o roteiro com personagens neuróticos e diálogos rápidos. Tudo dá errado nessa mal xerocada cópia das crônicas nova-iorquinas de Allen. Quase nenhuma piada funciona, pois o humor é ingênuo demais. As situações são irreais e muito, mas muito mal orquestradas. E, para variar, Chris Rock (aqui em um papel diferente do arquétipo que tentou criar no resto de sua carreira), revela-se mais uma vez um ator apático e sem graça. Os únicos momentos de luminosidade vêm das graciosas intervenções do personagem de Albert Delpy, pai de Julie no filme e na vida real. Se deixassem o veterano sozinho em cena, diante dos cartões-postais da Big Apple, o resultado seria melhor. Nota 4
150 - Amor Pleno (To The Wonder, 2012): não é preciso dizer que Amor Pleno é um filme dificílimo para a parcela do público que gosta mesmo é de ver os filmes de gênero repetirem infinitamente as mesmas tramas e reviravolta telegrafadas. Como todo trabalho de Terrence Malick, é uma produção desafiadora e com tantas camadas sobrepostas que vira quase obrigação vê-lo e revê-lo através dos anos, buscando novos significados a cada novo contato. Praticamente um filme sem diálogos, com a narrativa sendo desenvolvida através de imagens captadas pela extraordinária fotografia que já se tornou uma das marcas registradas da filmografia do diretor e por narrações em off e pouquíssimas frases soltas aqui e ali pelo elenco, é daqueles filmes em que cada tomada, por mais absurda que pareça, possui em si um enigma a ser desvendado. Amor Pleno também é o filme mais romântico do diretor desde Cinzas no Paraíso, de 1978. O que Malick pretende aqui é prestar tributo a uma ex-companheira francesa que morreu em 2008 e que, enquanto relacionou-se com ele, abandonou Paris e foi morar em seu rancho no meio-Oeste americano. O diretor usa esse pretexto autobiográfico para criar outra de suas obras-esfinges, em que o conceito de amor abordado através do casal de protagonistas (Olga Kurylenko e Ben Affleck) é mera sombra do Amor em sentido amplo que funde-se aos conceitos de Divindade e Natureza que o cineasta tanto aprecia investigar. De certa forma mais acessível que seus trabalhos imediatamente anteriores (O Novo Mundo e A Árvore da Vida), Amor Pleno, porém, carrega todas as marcas indissociáveis do diretor: a edição a princípio errática, que corta as cenas na metade, o apreço pela contemplação da natureza, a trilha sonora intrusiva. Os recursos funcionam, mas já começam a aproximar-se perigosamente de um cacoete. Talvez uma reinvenção de sua assinatura seja um caminho necessário nos próximos anos. De qualquer forma, quem se aventurar é capaz de encontrar uma obra emocionante e que traz consigo todos os temas caros ao diretor, principalmente a espiritualidade representada na subtrama do personagem de Javier Bardem, um padre em crise de fé. E o desfecho, quando o rosto de determinado personagem é iluminado abruptamente para, em seguida, enxergarmos certa paisagem, contém tantos significados que dificilmente assistir ao filme uma única vez dá cabo de toda a gama de intenções que Malick possui com essa história aparentemente simples. Vi há três dias e volta e meia me pego pensando no filme. Um ótimo sinal. Nota 8
151 - Alvo Duplo (Bullet To The Head, 2012): Stallone, depois de anos amargando fiasco atrás de fiasco nas bilheterias, foi esperto o suficiente para, na sequência de seu bom revival de Rocky Balboa, conseguir criar uma nova franquia para si (Os Mercenários), que presta tributo justamente aos filmes de ação descerebrados (mas divertidíssimos) dos anos 80. Já esse Alvo Duplo, adaptado de uma graphic novel francesa, apesar de explicitamente querer celebrar os anos dourados do cinema-testosterona, acaba por desandar em um produto com toda a cara de filme do Steven Seagal produzido diretamente para dvd nos anos 90. Com um roteiro pavoroso, mas pavoroso mesmo, o filme nunca consegue acertar o tom. Pretende homenagear os filmes policiais de duplas que vivem se engalfinhando, subgênero que nasceu e viveu seu ápice nos 80`s com 48 Horas, Máquina Mortífera e seus derivados, mas só consegue acertar o nível de qualidade daquelas produções da América Vídeo lançadas em VHS semanalmente nos anos 80. O enredo não tem pé nem cabeça, as piadinhas disparadas pela dupla central nunca funcionam e o elenco parece ter sido escolhido para tornar a atuação de Sly menos vergonhosa: é um festival de canastrice encabeçado por nomes como Sun Kang (da franquia Velozes e Furiosos), Adewale Akinnuoye-Agbaje (o Mr. Eko do seriado Lost), Jason Momoa (de Game Of Thrones e do execrável remake de Conan - O Bárbaro), o sumido (pelo jeito, ainda bem) Christian Slater e Jon Seda (As Duas Faces de Um Crime, O Pagamento Final). Pelo menos o filme conta com uma (UMA) boa cena de ação: o embate final entre o botocado, mas sarado, Stallone e o vilão de almanaque de Momoa. Muito pouco se pensarmos que o diretor por trás dessa bobagem é Walter Hill, responsável por filmaços como Warriors - Os Selvagens da Noite, 48 Horas e Ruas de Fogo. Se eu fosse o cara, apagava esse troço do currículo. Nota 5
* 152 - Mato Sem Cachorro (2013): por incrível que pareça, a julgar por um primeiro trailer horroroso e um segundo apenas passável, é uma comédia romântica que funciona e (o melhor de tudo) distancia-se muito das bobagens cômicas que infestam o cinema nacional há alguns anos. Adotando um humor muito mais próximo de um Comédias da Vida Privada do que a linha popular de lixos televisivos como o infame Zorra Total, Mato Sem Cachorro investe as fichas no formato das comédias românticas americanas, o que ironicamente é seu ponto mais forte e também o mais fraco. A estréia de Pedro Amorim (irmão de Vicente, diretor de O Caminho das Nuvens, Corações Sujos e de Um Bom Homem, com Viggo Mortensen) no comando de um longa-metragem se dá com o pé direito, demonstrando uma boa assinatura visual (e uma preocupação grande com a escolha de músicas da ótima trilha sonora) e uma esmerada direção de elenco (Bruno Gagliasso e Leandra Leal formam um casal simpático e ambos tiram de letra a tarefa de capturar desde o início a simpatia do público). Mesmo as inúmeras participações especiais, que tinham tudo para tornar o filme episódico e tirar o foco da trama central, nunca chegam a atrapalhar o desenvolvimento quadradinho do roteiro. Pelo contrário, a maioria das pontas funciona que é uma beleza (o personagem de Enrique Dias é sensacional; já Gabriela Duarte e Sandy, por exemplo, ganham a chance de debochar da imagem criada para elas pela mídia, o que resulta em algumas das cenas mais engraçadas do longa). Já Marcelo Tás e Rafinha Bastos ganham aparições que, embora não comprometam, também não acrescentam nada ao filme. Mas a surpresa mesmo é ver que Danilo Gentili, na maior parte do tempo, dá conta do recado como o primo sem noção do protagonista, adicionando improvisação e piadas cheias de referências pop que remetem ao humor de suas apresentações de stand up. Se por um lado é ótimo que Mato Sem Cachorro represente uma nova forma de fazer comédia no Brasil, sem apelar para o humor popularesco, também é uma pena que isso se dê ao repetir todos os clichês enervantes das comédias românticas americanas. Ainda bem que, se a estrutura é engessada, pelo menos há criatividade por trás das câmeras e na frente delas. Uma comédia que, contra todos os prognósticos, faz rir. Boa diversão. Nota 7
* 153 - Cinemania (Cinemania, 2002): um interessantíssimo registro da cinefilia quando esta atravessa os limites entre a paixão do cinema e a obsessão em seu estado mais puro, é também um belo recorte social que acompanha 5 personagens bizarros (e fascinantes) em suas maratonas cinéfilas por Nova York. Apesar de abordar a cinefilia dentro de sua faceta mais extrema, é impossível que um amante da Sétima Arte não se identifique, aqui e ali, com algumas das manias de seus personagens excêntricos e antissociais. Obrigatório para quem considera ir ao cinema muito mais do que um passatempo. Nota 8
154 - Searching For Sugar Man (Searching For Sugar Man, 2012): vencedor do Oscar 2013 de Melhor Documentário, é um dos filmes mais surpreendentes e envolventes desse ano. Adotando a mesma métrica narrativa do ótimo Catfish, de 2010 (com quem formaria uma sessão dupla irrepreensível), deliberadamente subtrai de sua trama inicial (a busca pela origem de um obscuro cantor americano que, desconhecido no Ocidente, alcançou fama comparável a Elvis na África do Sul) um elemento que serve de catalisador para uma inesperada reviravolta lá pela metade do filme, dando outro rumo e significado à trama. Essencial para quem curte rock e profundamente emocionante para todos, o filme também é imperdível para quem gosta de cinema. Um exemplo de construção narrativa que deveria ser seguido também pelas produções de ficção. Irretocável. Nota 9 
155 - Trabalhar Cansa (2011): entre o cinema comercial e o de autor no Brasil, Trabalhar Cansa talvez seja um dos melhores exemplos do que uma produção consegue entregar utilizando elementos de ambos, o que, ironicamente, vai afastar os defensores irredutíveis tanto do cinema comercial quanto do cinema autodenominado "de arte". Há de se ter a cabeça bem aberta para apreciar o que a produção tem de melhor. Fez sucesso em festivais, mas passou em brancas nuvens pelo circuito comercial, apesar de urdir uma peculiar mistura de gêneros: drama com toques de terror. Visão crítica das relações empregador-empregado e da nova classe média brasileira, faz uso de um surrealismo inesperado para arrematar a tese defendida pelo roteiro, o que causa tanto estranhamento como a óbvia repulsa de quem não entende o objetivo por trás da parábola criada pelo roteiro. A direção de atores é excelente e torna tudo ainda mais envolvente. Um filme de muitos questionamentos e pouquíssimas respostas. Bom material de discussão. Nota 8
156 - V/H/S/2 (V/H/S/2, 2013): coletâneas de histórias de terror são um prato irresistível para os fãs do gênero (e eu me incluo entre eles). O primeiro filme dessa série que coloca diretores da nova geração comandando pequenos curtas filmados no estilo "filmagens encontradas" era muito irregular e esse aqui não deixa de ter seus altos e baixos, mas há mais acertos do que erros nessa nova coleção, que inclui em uma hora e meia contos de fantasmas, mortos-vivos, demônios e alienígenas. Apesar do estilo câmera na mão já ter dado o que tinha que dar (e algumas seqüências mais irritam do que prendem a atenção, tamanha a dificuldade de visualizar o que acontece na tela), há muitos (e bons) sustos escondidos aqui e ali, além de uma dose forte de gore para os apreciadores de sangue e vísceras. A historinha que serve de "liga" entre os curtas é uma porcaria, mas quando o videocassete, dentro do filme, é acionado, a velha fita cassete de certa forma cumpre o que promete. Nota 7 
* 157 - Gravidade (Gravity, 2013, IMAX 3D): o cinema, lado a lado com a literatura, é uma das formas de expressão artística que melhor consegue proporcionar a imersão completa em uma narrativa de forma a provocar o escapismo quase automático da realidade, nem que seja por um curto espaço de tempo. Gravidade é daquelas obras que faz essa mágica acontecer em seu estado mais puro. E o impacto que provoca no público ao ser saboreada nas condições ideais (nesse caso em particular, em 3D e na tela gigante do IMAX) não encontra paralelo em nenhuma produção recente. Dirigida por um dos grandes cineastas da atualidade (o mexicano Alfonso Cuarón, dos excelentes Filhos da Esperança e E Sua Mãe Também), a produção é um novo marco no emprego irretocável da tecnologia no cinema. É praticamente impossível não ser transportado para o vácuo do espaço junto a sua ótima protagonista (Sandra Bullock, no melhor papel de sua carreira, com o perdão do trocadilho, mas há anos-luz do papel que lhe rendeu o Oscar no enlatado Um Sonho Possível). Claustrofóbico, Gravidade é daquelas montanhas-russas emocionais que não dão um respiro à platéia ao longo de seus enxutos 90 minutos de projeção. É daqueles filmes que grudam o espectador na poltrona do cinema, buscando um eixo de apoio que falta aos seus personagens, todos soltos na gravidade zero do espaço. Lotado de cenas com potencial para virar referência aos cineastas no futuro, desde o irrepreensível plano-seqüência de 17 minutos (!!!) com que abre o filme, passando pela pirotecnia das cenas de ação e as homenagens explícitas a clássicos da ficção científica (o bebê interplanetário de 2001 - Uma Odisséia No Espaço e a roupa de Sigouney Weaver em Alien - O Oitavo Passageiro são as de mais fácil identificação), Gravidade é o blockbuster perfeito: deixa o queixo no chão, mas o cérebro permanece plenamente ativo. Nem a discutível simplicidade do roteiro tem o condão de diminuir a obra, tamanha é a efetividade do arco dramático desenhado com esmero para a sua protagonista. Sem falar que a  fotografia, efeitos especiais e sonoros e principalmente a brilhante trilha sonora de Steven Price (de Ataque Ao Prédio) tornam o espetáculo inesquecível sob qualquer ponto de vista. Exemplo perfeito do casamento feliz entre entretenimento, fidelidade científica e autoralidade, Gravidade é o filme a ser visto por qualquer cinéfilo, seja ele fã de superproduções ou da programação dos cineclubes. E se existe um filme que merece ser visto com toda a pompa na tela do IMAX e em seu sensacional 3D, é esse aqui. A minha primeira reação ao sair do cinema e que talvez resumisse o texto acima foi: OH, MY FUCKING GOD!!! Nota 9  
158 - Byzantium (Byzantium, 2012): o cineasta Neil Jordan não só já demonstrou que sabe comandar tramas que brincam com o gênero do terror (A Companhia dos Lobos, O Fantasma Excêntrico), como também já provou que sabe abordar de forma correta os vampiros em Entrevista Com O Vampiro. Assim, esse conto vamp levado sob a ótica feminina começa muito bem, estabelecendo um clima adequado e personagens curiosas, com destaque para a vampira prostituta interpretada com algum talento e muita, mas muita volúpia, pela deliciosa Gemma Arterton, vista recentemente em João e Maria - Caçadores de Bruxas. A trama vai bem até o terceiro ato, quando todo o climão estabelecido até ali é deixado de lado em prol de uma sucessão descabida de clichês sem qualquer impacto que descambam em um final anticlimático e bobo como qualquer produção rasteira. Quando até um diretor que entende do riscado como Jordan consegue derrapar é porque os vampiros definitivamente andam em uma fase complicada no cinema. Nota 5
159 - As Bem-Armadas (The Heat, 2013): comédia policial que resgata as incursões cômicas do gênero nos anos 80, mas com uma pegada muito mais humorística do que de ação, cortesia do diretor Paul Feig, dos seriados Arrested Development e The Office (a versão americana). A química entre a dupla formada por Sandra Bullock e Melissa McCarthy (Missão Madrinha de Casamento) funciona que é uma maravilha, o que garante algumas boas risadas, o que é artigo de luxo em um ano fraco para comédias como está sendo 2013. O roteiro é daqueles derivativos até dizer chega, mas fazer rir é o grande trunfo aqui. Diversão honesta. Nota 7
160 -  O Ataque (White House Down, 2013): espécie de "Duro de Matar na Casa Branca", esse novo longa do alemão Roland Emmerich diverte medianamente pelos absurdos das cenas de destruição, algo previsível na filmografia do diretor (Independence Day, O Dia Depois de Amanhã e 2012), e por alguns bons momentos de humor da dupla de protagonistas formada pelo galã Channing Tatum e pelo oscarizado Jamie Foxx. Mas o roteiro é tão (mas tão!!!!) chulé que é de bom tom assistir o filme acompanhado de algum saco de vômito de prontidão a cada cena em que há um diálogo ufanista apontando os americanos como os guardiões da civilização ocidental. E quer tomar um porre? Tome uma dose de tequila a cada tomada em câmera lenta e toda vez que um personagem solta uma tirada supostamente engraçadinha, mas totalmente deslocada, em meio a uma cena que deveria ser tensa. É coma alcóolico na certa. Fora que há uma completa discrepância de tom aqui: enquanto o filme é escrito de forma absolutamente desleixada, o que combinaria com um climão de trash assumido como o de Os Mercenários, Emmerich insiste em tratar a produção, principalmente nas cenas que envolvem os bastidores da crise que serve de mote para o filme, com uma solenidade que pode arrancar risos embaraçados até do mais crédulo dos espectadores. E confiem em mim: a personagem da filha do mocinho (Joey King, vista ainda esse ano em Oz: Mágico e Poderoso e Invocação do Mal) é a pessoinha mais mala do cinema nos últimos anos. Um filme para ver, esquecer e jurar que não teve prazer algum durante as mais de duas horas de projeção. Nota 5 
161 - Os Crimes de Snowtown (Snowtown, 2011): produção australiana que registra o maior caso de assassinatos em série da história da terra dos cangurus. Apesar do clima correto e permanentemente opressor, é visível a pretensão dos realizadores em entregar um filme para fazer a alegria de festivais e mostras de cinema (desejo esse que até se realizou, com direito a Menção Especial na Semana dos Críticos de Cannes 2011 e tudo). O problema é que o distanciamento proposto pelo filme acaba por revelar-se uma faca de dois gumes: se por um lado, o enfoque seco é eficaz nesse tipo de produção, por outro esse olhar de fora distancia o público dos personagens, tanto protagonistas quanto coadjuvantes, o que tem como efeito imediato a completa indiferença com o destino deles. O que, de certa forma, contamina até mesmo as atuações, principalmente do equivocado personagem principal, apático em um nível muito além do autismo. Nota 5
* 162 -  Os Suspeitos (Prisoners, 2013): esse novo trabalho do diretor canadense Denis Villeneuve, do sensacional Incêndios (Incendies, de 2010), me deixou indeciso. Em primeiro lugar, é um filme com uma construção de personagens impecável, o que é ainda mais evidente no desfecho da trama central, que pega cada uma das cenas vistas durante os seus 153 minutos e as encaixa como peças em um enorme quebra-cabeças diante dos olhos da platéia. E as atuações, pelamordedeus... além do elenco estelar estar todo (TODO) ótimo, é impossível atribuir alguma falha às impecáveis atuações de Hugh Jackman e Jake Gyllenhaal, ambos sensacionais encarnando duas face de uma mesma moeda, os dois como os verdadeiros "prisioneiros" do título original, mal traduzido para o Brasil como o genérico "Os Suspeitos". Por outro lado, é um filme que, em sua conclusão, releva alguns velhos (e batidos) clichês do gênero do suspense policial, apesar de evitá-los durante quase toda a projeção. Seria, portanto, o filme um reles produto de entretenimento com maquiagem independente ou um filme autoral cujo desfecho revela uma faceta comercial para alegria do público? O que eu sei é que preferiria um final ambíguo, como o de Zodíaco, de David Fincher, que guarda muitas similaridades com esse Os Suspeitos. Menos mal que a cena final siga justamente nessa vibração, omitindo do grande público algo que, para ele, faria toda a diferença. Porém, a mão de Villeneuve para transformar um roteiro lento em hipnose coletiva durante as mais de duas horas de projeção, auxiliado pela sempre ótima fotografia do mestre Roger Deakins (Um Sonho de Liberdade, Onde Os Fracos Não Têm Vez), é realmente impressionante. Mesmo com suas concessões, é um suspense muito, mas muito sólido. Nota 8
163 - Depois da Terra (After Earth, 2013): houve uma época em que M. Night Shyamalan foi taxado de um dos talentos mais promissores de Hollywood, inclusive por mim, depois de dois trabalhos sensacionais (O Sexto Sentido e Corpo Fechado) e um entretenimento acima da média (Sinais). Com A Vila e A Dama Na Água, o cineasta parecia começar a se repetir, mas ainda assim, aqui e ali, era possível vislumbrar uma tomada bem orquestrada, um personagem interessante, um rodapé de roteiro bem escrito. O que veio depois (a segunda metade de Fim dos Tempos e principalmente O Último Mestre do Ar) parecia trabalho encomendado para enterrar a carreira, tamanha a incompetência narrativa demonstrada (o que contrapunha justamente a segurança e comando da direção de seus primeiros filmes). Com esse Depois da Terra, Shyamalan pelo menos não demonstra tanta frouxidão na condução da trama, mas ainda assim permanece há anos-luz do que um dia enganou ser enquanto cineasta. E de nada ajuda a produção ser um mero veículo para Will Smith tentar consolidar a carreira de seu filho Jaden, que aqui, ao contrário do correto remake de Karatê Kid, nada faz para ajudar, entregando um protagonista mirim aborrecido e de difícil empatia. Já seu pai interpreta o papel mais antipático de sua carreira, um tipo eternamente emburrado e monossilábico que traduz na testa franzida a bobagem que é a filosofia militarista da Cientologia por trás do roteiro. Com uma direção de arte que chupa até o último pixel de Avatar, é um filme morno, chato e de mensagem ultrapassada. Shyamalan parece ter chegado ao fundo do poço ao sequer tentar imprimir alguma autoralidade em um projeto de encomenda. RIP para sua carreira. Nota 4 
164 - Além das Montanhas (Dupa Dealuri, 2012): a temática recorrente na filmografia do cineasta  Cristian Mungiu (do sensacional 4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias) é o apontamento das dicotomias presentes na sociedade romena após a redemocratização do País. O interesse de Mungiu reside justamente em demonstrar como a herança paternalista do regime comunista ainda está enraizada na cultura local, com uma população em constante estado de inadequação com a cultura capitalista dos novos tempos. Em seu último trabalho, Mungiu acrescenta mais um elemento de crítica à sua lente: utiliza como base um inacreditável caso real para expôr não só a fragilidade do funcionalismo público romeno, mas a presença sombria da Igreja Ortodoxa na sociedade, com seus métodos e dogmática medieval, um resquício de tempos anteriores aos da abertura política. Fazendo isso, Mungiu cria um dos mais contundentes relatos sobre o fundamentalismo religioso dos últimos anos, que aplica-se não só à Igreja Ortodoxa Romena, mas a qualquer desses cultos com cara de programa de auditório presentes em qualquer esquina no mundo inteiro. Com suas duas horas e meia que passam muito lentamente, provocando um sentimento de torpor parecido com aquele que envolve as personagens confinadas no convento que serve de microcosmo no filme, Além das Montanhas é uma obra  que precisa ser apreciada com paciência e atenção. Por trás de um aparente descaso com fotografia e direção de arte (e ausência de trilha sonora), o registro naturalista do diretor engana os incautos: é justamente através da fotografia, cenários e figurinos que Mungiu insere elementos-chave para compreender a sua visão. Muita coisa é revelada justamente ao não ser mostrada: a real natureza da relação entre as protagonistas, a reação de uma delas após uma sessão de confissão que não é vista pelo espectador... E, assim como em 4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias, guarda para o último plano do filme uma imagem que pode passar despercebida pela maioria do público, mas que revela-se uma verdadeira carta de intenções do cineasta como um alerta pela preocupante fragilidade do Estado laico no mundo moderno. Sensacional. Nota 8,5
165 - A Perseguição (The Grey, 2011): o maior sinal de amadurecimento do diretor Joe Carnahan (A Última Cartada e Esquadrão Classe A) talvez esteja reservado para o final corajoso desse thriller de sobrevivência que, vendido como filme de ação, está a léguas de distância das convenções do gênero. Preocupado com desenvolver o interessante personagem central (interpretado com competência por Liam Neeson, que sabe empregar a voz grave e o jeito durão que maturou em filmes de pancadaria para dar vida a um sujeito com muito mais complexidade escondida sob a superfície do papel genérico que aparentemente lhe é reservado) e mesmo os coadjuvantes, revelados através de diálogos espertos durante o filme. O minimalismo empregado por Carnahan, desde o acidente de avião que é visto sob perspectiva subjetiva até a economia com que a ameaça principal (os lobos) é enquadrada, lembrando muito o Tubarão de Spielberg, serve de preparação para um clímax que diferencia-se do cinemão comercial de sempre. O que vai torcer o nariz de muita gente, mas que apresenta-se como um desfecho muito mais interessante para quem conseguir compreender o conto de sobrevivência humanista que foi contado até ali. Bela surpresa. Nota 8
166 - The Lords Of Salem (The Lords Of Salem, 2012): para mim, o roqueiro Rob Zombie ganhou notoriedade como cineasta de forma absolutamente injusta com filmes como A Casa dos Mil Mortos e a sua reimaginação do clássico Halloween. Nenhum deles é um bom filme (Halloween II, inclusive, é dos piores exemplares recentes do gênero). O melhor trabalho de Zombie até hoje é Rejeitados Pelo Diabo, em que conseguiu equacionar com competência as referências ao cinema dos anos 70 e a sua capacidade de criar imagens intrigantes. Nesse The Lords Of Salem, Zombie demonstra maturidade na narrativa cinematográfica, criando planos e cenas plasticamente belíssimas, principalmente no excelente primeiro ato, que apresenta personagens e engatilha a trama de forma exemplar. Há muito com que simpatizar no trabalho de Zombie: a celebração ao cinema clássico (principalmente Carl Theodor Dreyer e Georges Méliès), o resgate de atrizes do passado (Meg Foster, Dee Wallace, Maria Conchita Alonso), a aparente ausência de efeitos digitais e a abundância de efeitos práticos ancorados em maquiagem e em bonecos prostéticos. O problema é que, da metade em diante, o roteiro de Zombie não consegue mais disfarçar a sua inegável fragilidade, relegando a história a uma interminável (e chata) seqüência de imagens que mais parece saída de um clipe de sua banda, White Zombie. Com um roteiro decente em mãos, talvez Zombie consiga revelar-se um cineasta relevante dentro do cenário atual. Infelizmente, não foi dessa vez. Nota 5
* 167 - Serra Pelada (2013): demorou para o cinema nacional resolver explorar com o devido tom épico a grande corrida do ouro brasileira de Serra Pelada, na primeira metade da década de 80, o que até agora só Os Trapalhões tinham se aventurado a fazer num dos filmes mais queridos do quarteto. Heitor Dhalia (O Cheiro do Ralo, À Deriva) tomou para si a tarefa e criou, como era de se esperar, uma superprodução que enche os olhos e aproveita as similaridades que o cenário e o contexto social tinham prontas para aproveitar em um faroeste verde-amarelo. Pena que o esmero com fotografia, direção de arte e o excelente elenco (todos muito bem, com destaque para o impagável coadjuvante interpretado com um misto de sociopatia e malemolência por Wagner Moura, com direito a bigodinho e careca proeminente) não encontre uma parceria à altura no roteiro capenga escrito a quatro mãos por Dhalia e Vera Egito. O problema é que lá pelas tantas a trama parece atolar em meio ao barro em que chafurdam os personagens, patinando em cima de subtramas batidas e enfadonhas como o romance de um dos protagonistas com a prostituta vivida pela gatinha Sophie Charlotte ou a súbita (e improvável) mudança de personalidade de Juliano Cazarré, que passa de brutamontes de bom coração a gângster em duas tomadas. Esse problema de estrutura atrapalha o bom desenvolvimento de uma estória que, mais enxuta (e investindo mais no ótimo antagonista vivido por Wagner Moura e, principalmente, no subaproveitado vilão de Matheus Nachtergaele) poderia ter resultado em um filme memorável. Apesar disso, como está (e perdoando aqui e ali as desnecessárias chupadas que dá no roteiro e na edição de Cidade de Deus, que soam gratuitas e não acrescentam nada para o filme), ainda é um faroeste bem bacana e que merece ser conferido na tela grande. Nota 7
* 168 - O Conselheiro do Crime (The Counselor, 2013): ao final do excelente Onde Os Fracos Não Têm Vez, o roteiro dos irmãos Coen coloca na boca do personagem de Tommy Lee Jones um longo (e primoroso diálogo) que não só condensa todas as provocações intelectuais que o longa pretendia como também presta tributo ao texto do renomado escritor Cormac McCarthy, autor do romance em que se inspirou aquele longa (No Country For Old Men). Dono de uma verve literária reverenciada e cuja obra já fora adaptada outras vezes pelo cinema (são dele também os livros que serviram de base para os longas Espírito Selvagem e A Estrada), em Conselheiro do Crime McCarthy se aventura pela primeira vez como roteirista em uma trama escrita especialmente para a telona. Bem, tudo dá errado nessa sua primeira incursão. Talvez achando (equivocadamente) que aquela cena citada lá no começo tenha sido a chave isolada para o sucesso de Onde Os Fracos Não Têm Vez, o roteirista criou aqui um texto em que todos os inúmeros personagens desse thriller policial resolvem sistematicamente filosofar sobre a natureza da vida, da morte, da ganância, dos diamantes, do zzzzzzzzzzzzzz. Sim. Em O Conselheiro do Crime, até o mais anônimo dos extras tem a chance de aconselhar o protagonista (o advogado conselheiro do título, vivido por Michael Fassbender com a mesma paleta de emoções usada como o andróide de Prometheus) em intermináveis palestras que tentam a todo custo tornar a trama mais complicada que a Bíblia em esperanto. O problema é que a historinha, após um rápido raciocínio ao final da sessão, poderia ser resumida em duas linhas com direito a adjetivos e advérbios a torto e a direito. Diante de toda a verborragia do roteiro vociferada sem dó nem piedade pelo elenco (uma verdadeira constelação de estrelas hollywoodianas que inacreditavelmente toparam participar da produção), o diretor Ridley Scott tomou a decisão mais bizarra de sua carreira desde que transformou sua versão de Robin Hood em um Coração Valente sem saias: a de simplesmente sentar em sua cadeira e deixar o negócio rolar descontrolado. O resultado é um thriller tão monótono e chato que torna a arte de olhar a grama crescer um esporte olímpico. A única alternativa para conter o sono é parar e analisar o esforço hilariante de Cameron Diaz em tentar, com caras e bocas, incorporar uma femme fatale moderna, com direito a simulação de sexo com o para-brisa de um carro (sim, eu escrevi certo!!!). Pelo menos a fotografia é bonita. Dá uma boa iluminação para o sono. Nota 3  
* 169 - Uma Noite de Crime (The Purge, 2013): apesar da premissa bacana (no futuro próximo, os EUA têm um dia por ano em que qualquer tipo de crime é liberado), o desenvolvimento é precário. Nos primeiros 30 minutos, estabelece uma subtrama protagonizada por um candidato a genro que nunca diz a que veio e nos próximos 20 minutos investe em um inverossímil jogo de gato e rato entre familiares, no escuro, em busca uns dos outros dentro de uma casa, como se o imóvel fosse maior que o Palácio de Versalhes. O filme ironicamente reencontra os trilhos quando investe no elemento catalisador de seu pretenso futuro distópico (a violência), mas dessa vez do ponto de vista dos mocinhos (e a seqüência de ação ambientada dentro de uma sala de jogos é muito bem orquestrada). O final, que subverte as convenções do gênero e explicita as pretensões do filme enquanto crítica social, é aquele balde de água fria no público ávido por um banho de sangue extra. Isso é engraçado, pois é o único momento em que a produção justamente diz a que veio. No geral, uma  besteira. Mas que não dói. Nota 6
** 170 - Kick Ass - Quebrando Tudo (Kick-Ass, 2010): fica ainda melhor quando revisto. É a mistura perfeita de humor negro, referências pop e ultraviolência que fazem dessa feliz produção uma das melhores adaptações de quadrinhos já feitas. Tudo funciona como um relógio suíço. Nota 9
** 171 - Thor (Thor, 2011): na primeira revisão, alguns defeitos ficam acentuados, principalmente a ausência de um vilão que represente uma ameaça real, apesar do Loki de Tom Hiddleston ser um achado que rouba todas as cenas para si. O diretor Kenneth Branagh, escolado que é nas adaptações de Shakespeare tanto na telona quanto nos palcos, mostra a que veio nas intrigas palacianas e na relação conturbada entre o Odin de Anthony Hopkins e seus filhos, tudo muito bem encenado. A trama cai muito quando a ação é transferida para a Terra, apesar das cenas de humor funcionarem bem, principalmente porque o protagonista Chris Hemsworth é um sujeito que transpira simpatia. O visual de Asgard é de cair o queixo, enquanto a opção de ambientar a subtrama em uma cidadezinha minúscula americana simplesmente não funciona. No geral, uma diversão razoável, às vezes aquém do potencial do personagem. Nota 7   
172 - Europa Report (Europa Report, 2013): produção independente americana que insiste no subgênero dos filmes de imagens encontradas, mas com alguns diferenciais que fazem toda a diferença. Em primeiro lugar, as imagens não parecem um VHS surrado e tudo é muito nítido. Além disso, o elenco não é formado por desconhecidos: estão em cena Michael Nyqvist (da trilogia Millenium sueca e vilão de Missão: Impossível 4), Sharlto Copley (Distrito 9, Esquadrão Classe A, Elysium), Christian Camargo (do seriado Dexter), Embeth Davidz (A Lista de Schindler) e Anamaria Marinca (4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias). Mesmo assim, como todas as produções desse gênero, limita-se a registrar, durante 90 % do tempo, apenas a interação entre os personagens, sem mostrar nada da ameaça espacial que é o mote do filme. Ainda assim, prende a atenção. Há uma preocupação científica evidente no filme, que contou com consultores da NASA durante a produção. E é justamente esse viés que privilegia o tema da busca científica que destaca o filme de seus pares (principalmente, do pavoroso Hangar 18, que tinha uma premissa parecida) e releva os cacoetes recorrentes dos "found footage films". Nada demais, mas essas pequenas notas dissonantes destacam o filme de seus irmãos gêmeos.  Nota 7
 173 - Evocando Espíritos 2 (The Haunting In Connecticut 2: Ghosts Of Georgia, 2013): o título original consegue a proeza de transformar a tradução brasileira menos horrorosa, com a sua inacreditável contradição geográfica. Essa franquia que busca adaptar muito livremente histórias baseadas em fatos supostamente reais teve início com um filmeco que conseguia, aos trancos e barrancos, armar alguns bons sustos, o que garantiu sucesso de bilheteria e garantiu o sinal verde para essa seqüência que aborda outra família às voltas com o sobrenatural. Essa continuação apresenta uma sucessão impressionante de aparições e vultos, mas a imensa maioria deles é sabotado pela direção amadora e pelo elenco sofrível. O roteiro, como já era de se esperar, é um amontoado dos clichês do gênero. Quando, lá pelas tantas, uma personagem pega uma tesoura de cozinha para tentar combater um fantasma, dá para antever que a coisa só vai dali para pior. E vai. Assustadoramente ruim. Nota 3 
* 174 - Thor: O Mundo Sombrio (Thor: The Dark World, 2013, em 3D, IMAX):  deixando de lado os equívocos da primeira investida da Marvel em levar às telas o personagem do Deus do Trovão, que não abraçava totalmente a natureza cósmica do personagem, alternando sem muita convicção o realismo exigido pelo público mais jovem com a magia que é intrínseca às aventuras do herói, esse novo filme abraça de vez a Fantasia com F maiúsculo. Por isso mesmo, consegue superar o antecessor em todos os quesitos, a começar pela presença de um vilão que realmente apresenta um perigo consistente para o protagonista. Além disso, a presença de Loki é aproveitada ao máximo aqui, ancorada em mais uma atuação irretocável de Tom Hiddleston, que rouba todas as cenas para si, mesmo quando tem de contracenar com Sir Anthony Hopkins. Visualmente espetacular, aproveita cada um de seus incontáveis efeitos especiais para tornar os mundos em que se passa a trama, cada um a sua maneira, um deleite para os olhos. Todo esse cuidado visual traz evidente a opção em tornar o filme não só mais uma aventura de super-herói, mas um filme realmente de fantasia, dotado de um tom muito mais próximo de Star Trek/Star Wars/A História Sem Fim do que dos filmes dos outros heróis da Marvel, sempre escorados muito mais na Ciência do que na magia. E mesmo a boboca trama principal, um trololó besta que envolve alinhamento de planetas e portais interdimensionais (e que não resiste a meia raciocinada para desabar), acaba por contribuir para a sensação de se estar vendo um gibi vertido em carne e osso e não um filme que pretende ser levado a sério. Mas é mesmo a excelência com que mistura o caráter aventuresco das histórias em quadrinhos com o humor que fazem Thor: O Mundo Sombrio triunfar sobre a maioria das superproduções recentes. Intercalando momentos de máxima adrenalina (com a proverbial destruição ensurdecedora de cenários digitais) com outros de comédia pura, o filme é uma montanha-russa envolvente e ruidosa. Exatamente como os gibis em que busca inspiração. A Marvel tem cada vez menos vergonha na cara. E isso é motivo de alegria para todo piá que um dia acreditou em um Deus do Trovão que garantia a segurança do universo brandindo um martelo mágico. Antes que a vida adulta batesse na porta e estragasse essa divertida ilusão. Nota 8
* 175 - Meu Passado Me Condena: O Filme (2013): nunca assisti ao seriado do canal pago Multishow que serviu de base para essa produção, assim como (confesso) há muito tempo desisti dessa nova onda de comédias brasileiras com um pé no humor televisivo e outro no inferno dos clichês do cinemão americano (da safra dos últimos anos, só arrisquei Mato Sem Cachorro porque me pareceu menos Zorra Total do que os seus pares e, para meu alívio, era mesmo). Meu Passado Me Condena (título infeliz e derivativo tanto para um seriado quanto para uma comédia cinematográfica) não possui, há de ser destacado, o tipo de humor calcado na pornochanchada de programas televisivos como Zorra, A Praça É Nossa e por aí vai. O objetivo aqui é fazer uma comédia centrada nos pequenos desencontros e desentendidos de um casal comum, mais ou menos como uma cópia mal xerografada de Os Normais. O problema é que nem a diretora Julia Rezende nem os roteiristas possuem o talento de Fernanda Young e Alexandre Machado para achar no cotidiano da classe média as quase imperceptíveis manias e vícios de comportamento que amparam as grandes piadas. Fica evidente aqui que a opção em rodar o longa durante um cruzeiro de verdade, com turistas servindo de extras, apressou as coisas ao ponto do timing da filmagem resultar truncado justamente pela pressa em rodar as cenas no navio. Se por um lado dá para se esbaldar com belas imagens de Casablanca e do litoral da Itália, por outro a sensação é que o roteiro, dentro do transatlântico, nunca atinge a velocidade de cruzeiro ideal para uma comédia romântica. Os coadjuvantes interpretados (bem, diga-se de passagem) por Marcelo Valle e Inez Viana ganham a mesma função dos anti-cupidos das comédias de Shakespeare (Muito Barulho Por Nada e Noite de Reis, em especial), mas, apesar da referência de peso, apenas atrapalham o andamento (e o timing) da comédia. O que resta são alguns momentos divertidos, mas todos eles protagonizados pelo humor de improviso de Fábio Porchat, que apesar de eternamente preso no personagem gaiato dos vídeos do Porta dos Fundos, é um cara naturalmente engraçado. Só ele para tornar até momentos constrangedores como a correria final em uma cidadela italiana mais do que uma reles cópia do que há de mais batido no cinema americano. Nota 5,5
* 176 - Capitão Phillips (Captain Phillips, 2013): é de ter arrepios na espinha imaginar o que um baita roteiro como esse de Capitão Phillips poderia se tornar nas mãos erradas. Por isso mesmo, tentar antever o que um Michael Bay ou um Roland Emmerich poderiam fazer com o filme revela-se um exercício importante de cinefilia e um justíssimo tributo ao que o ótimo Paul Greengrass (Domingo Sangrento, Vôo United 93, A Supremacia Bourne) conseguiu realizar aqui. Demonstrando que conseguiu atingir na medida exata o equilíbrio entre o seu estilo documental de filmar com o potencial explosivo das histórias que lhe caem nas mãos (o que já rendera o excelente O Ultimato Bourne e o subestimado Zona Verde), Greengrass entrega aqui um filme que transpira tensão do começo ao fim da projeção sem nem por um fotograma sequer resvalar para o melodrama ou a patriotada besta tão comuns à cinematografia ianque, principalmente quando a produção envolve registrar incidentes que envolvem a política externa americana. Espécie de manual da boa condução narrativa, Capitão Phillips de cara já ganha o espectador ao colocar, na pele de um protagonista difícil e que foge da caricatura do salvador da pátria, um rosto que ganha a empatia imediata do público (o  talentoso astro Tom Hanks, que dificilmente deixará de concorrer ao Oscar do próximo ano, nem que seja pela irretocável nuance que dá ao personagem em suas duas últimas cenas, ambas improvisadas na hora da filmagem e que revelam-se os pontos emocionais cruciais do longa). Sem nunca privilegiar a figura do herói, o roteiro faz a mágica de conseguir com que nos importemos não só pelo refém, mas também pelos sequestradores, todos eles registrados com todas as camadas sociais e políticas que se esperaria de um cineasta com a visão política madura de Greengrass. Não há no filme mocinhos e bandidos e essa visão humanista de um fato com forte tendência à parcialidade crítica faz uma bruta diferença para o resultado final. O elenco de apoio, buscado por Greengrass junto à comunidade somali americana, é de uma eficiência espantosa. Eu ficaria muito feliz se Barkhad Abdi, que interpreta o líder dos piratas no filme, ganhasse ao menos uma indicação como Melhor Ator Coadjuvante no Oscar 2014. Nota 8,5   
177 -  30 Minutos Ou Menos (30: Minutes Or Less, 2011): demonstrando que a azeitada mistura de gêneros que imprimiu a Zumbilândia foi um mero acaso do destino, o diretor Ruben Fleischer (Caça Aos Gângsteres) se enrola todo aqui, entregando uma produção que nunca consegue equilibrar o humor e a ação contidas no roteiro do estreante Michael Diliberti. Sem convicção entre comandar uma comédia anárquica ou um filme policial com toques de humor, o filme padece dessa indecisão crônica até nas atuações do elenco. Enquanto Jesse Eisenberg (A Rede Social) atua em seu modo cômico-abobalhado, Danny McBride (Segurando As Pontas) faz um vilão com personalidade sombria demais, o que trunca as piadas e, por extensão, nunca faz a boa idéia (a do entregador de pizza que é sequestrado, atado a um colete-bomba e obrigado a assaltar um banco) decolar como deveria. Diverte aqui e ali, mas sempre que parece que vai alçar vôo, arremete ao solo. Nota 5
178 - Wolverine: Imortal (The Wolverine, 2013): já era de se esperar que fosse bem superior ao bizarro e equivocado X-Men Origens: Wolverine (2009), primeira incursão solo do personagem. E é. Mas ainda assim não é aquele filmaço que o herói mutante merece para chamar de seu. Hugh Jackman já demonstrou à exaustão que consegue incorporar o personagem com um pé nas costas e aqui não é diferente, mesmo que o ator não possua as características físicas de sua encarnação-base (nos quadrinhos, Wolverine é baixinho, por exemplo). Alardeado como uma adaptação de uma das melhores histórias do personagem ("Eu, Wolverine", minissérie de Chris Claremont e Frank Miller), o longa toma emprestado dela muito pouca coisa. Além da ambientação em Tóquio e da aparição de um ou outro personagem (muitos com motivações completamente diferentes da HQ), não resta quase nada em comum com o material original. É interessante que justamente a melhor idéia desse arco (colocar o personagem em um ambiente totalmente diferente de sua persona, o Japão moderno) funciona aqui que é uma maravilha. O sentimento de inadequação ao ambiente sisudo e cheio de regras das tradições nipônicas é o que o filme tem de mais original em relação às outras produções da franquia X-Men no cinema. E Jackman, com seu jeitão durão e monossilábico (quase um Eastwood dos faroestes em que encarnava o pistoleiro sem nome) parece realmente deslocado do meio em que é inserido pelo roteiro, que adota um tom cadenciado mais próximo dos policiais setentistas do que dos blockbusters da Marvel Studios. Toda a trama sobre a cura de sua suposta "imortalidade" é uma bobagem chata e que não acrescenta nada ao cânone do personagem no cinema. Já a opção em apostar na vilã Víbora é totalmente equivocada, pois é uma personagem que remete, no visual e na essência, à Hera Venenosa de Batman & Robin, espécie de referência que é a maldição das maldições em se tratando de adaptações de quadrinhos (e como nenhum dos realizadores se deu disso durante a pré-produção é uma grande incógnita). Por outro lado, as cenas de ação funcionam, principalmente a excelente luta em cima de um trem-bala e o embate final com um Samurai de Prata que não tem nada a ver com aquele das HQs. Para fazer coro com absolutamente todas as pessoas que escreveram sobre o longa, a cena no meio dos créditos, que faz a ponte com a próxima produção dos X-Men (Dias de Um Passado Futuro) realmente quase vale pelo filme inteiro. Quase. Nota 7
179 - Tabu (Tabu, 2012): diretor do elogiadíssimo Aquele Querido Mês de Agosto (que eu, não sei por quê cargas d´água, ainda não vi), o português Miguel Gomes conquistou novamente os festivais mundo afora com esse Tabu, homenagem explícita ao longa homônimo do mestre F. W. Murnau, de 1931. O que interessa a Gomes, mais ainda do que a bela história de amores perdidos contadas pelo roteiro de sua co-autoria, é render uma homenagem sincera aos primórdios da Sétima Arte, principalmente às produções da era do cinema mudo. Separando o seu filme em dois segmentos muito distintos entre si (ambos filmados em um preto e branco deslumbrante), Miguel Gomes inicia o longa como um conto contemporâneo que explicita como a sociedade moderna dialoga de forma equivocada com o seu passado. Essa inadequação é evidente a começar pelos diálogos cuspidos de forma premeditadamente robótica pelo excelente elenco, o que causa estranheza imediata no público. Em sua segunda metade, Tabu torna-se um fluxo de memórias narradas, sem nenhum diálogo, tornando a bonita história uma reminiscência memorialística que, dada à forma com que é contada, torna-se ainda mais emocionante. É esse contraponto formal entre o cinema falado e o mudo, entre o moderno e o antigo, entre o hoje e o ontem, que fazem do filme algo especial. E, nas entrelinhas, o diretor ainda entrega uma visão sóbria e madura sobre a relação entre Império e colônias. É um filme para poucos, mas para esses, é uma obra essencial. Nota 8,5 
180 - Os Amantes Passageiros (Los Amantes Pasajeros, 2013): todo grande diretor tem direito a soltar a franga, liberar os demônios, chutar o pau da barraca de tempos em tempos. Dessa vez, Pedro Almodóvar fez isso e muito, mas muito mais. Deixando de lado as tramas sérias vistas em seus últimos trabalhos, Almodóvar aqui parte para a Andrcomédia rasgada, gay até dizer chega, sem preocupação alguma com a hermética formal vista em seus filmes desde Tudo Sobre Minha Mãe. O resultado é desigual. Se por um lado há uma constante sensação de diversão e despreendimento, por outro as piadas, quando não funcionam, aproximam-se do humor rasteiro dos programas populares do gênero. E não há qualquer preocupação com o roteiro, que mal e mal consegue costurar os personagens dentro do fiapo de trama, toda ela passada dentro de um avião com problemas de aterrissagem. Têm coisas que não se justificam (a ponta de Antonio Banderas e Penélope Cruz, no início, assim como a de Paz Vega, no meio, não dizem a que vieram), outras que soam ingênuas, como as gags envolvendo determinadas excrescências fisiológicas e por aí vai. O resultado é desculpável porque evidentemente Almodóvar queria dar um tempo de seus melodramas tão bem construídos. Agora já teve e pode nos poupar de uma sequência. Mas justiça há de se fazer: a cena em que os três comissários de bordo gays resolvem dublar I´m So Excited, das Pointer Sisters, para distrair a tripulação, já nasceu clássica. Nota 6,5  
* 181 - Blue Jasmine (Blue Jasmine, 2013): Woody Allen é um dos roteiristas que melhor sabe criar personagens femininas realistas e, por isso mesmo, inesquecíveis. Em Blue Jasmine, o seu retorno ao drama depois de uma série de comédias mais ou menos efetivas, Allen dá vida a uma de suas mais complexas personagens, uma ricaça que perdeu tudo, menos a empáfia e a falsa altivez que em certos momentos a tornam dolorosamente odiável. Longe dos registros cômicos fantasiosos (Scoop: O Grande Furo, Meia-Noite Em Paris) ou popularescos (Para Roma Com Amor), Blue Jasmine, apesar de bem-humorado (e os personagens de Andrew Dice Clay e Bobby Cannavale são alívios ótimos), é um relato trágico sobre a depressão, com todas as reminiscências da literatura russa que tanto Allen adora, principalmente a relação de causa e efeito presente em Crime e Castigo e seus pares, algo que aproxima muito o longa de trabalhos anteriores do diretor, como Crimes e Pecados e Ponto Final - Match Point. Toda a complexidade, dubiedade de caráter e riqueza da personagem principal não seriam suficientes para tornar a produção bem-sucedida se não fosse a excepcional (e irretocável) performance de Cate Blanchett, que se não levar o Oscar no próximo ano é porque houve algum equívoco na contagem dos votos. É dela a melhor atuação de uma atriz em 2013. E é de Woody Allen um dos filmes mais cruéis e interessantes do ano também. Nota 9]
* 182 - Jogos Vorazes: Em Chamas (The Hunger Games: Catching Fire, 2013): de todas as franquias destinadas ao público adolescente nos últimos anos, Jogos Vorazes é disparada aquela com material menos nocivo para o cérebro, com um cuidado na narrativa cinematográfica evidente e que funciona até para os marmanjos incautos que se aventurarem por suas duas horas e pico de duração. O primeiro exemplar da série, do ano passado, capitaneado pelo mesmo Gary Ross de Seabiscuit - Alma de Herói e A Vida em Preto e Branco, já era bacana, mas é esse novo capítulo que definitivamente amplifica a mitologia dos livros que lhe serviram de base e distancia os filmes de uma mera versão para adolescentes do mangá (e do filme japonês) Batalha Real. E olha que esse Em Chamas se dá ao luxo de começar muito lentamente a sua narrativa (não há nem vislumbre de uma cena de ação na primeira hora de projeção!), o que teria tudo para induzir o público adulto ao sono, mas nas mãos de Francis Lawrence (Constantine, Eu Sou A Lenda) fica bem interessante de acompanhar. E quando a adrenalina chega, ela compensa (a cena dos babuínos, por exemplo, é um primor de execução e montagem). Quanto às atuações, Jennifer Lawrence continua perfeita no papel de heroína, ainda mais amparada com um dream team de coadjuvantes (Donald Sutherland, Phillip Seymour Hoffman, Elizabeth Banks, Stanley Tucci, Lenny Kravitz, Jeffrey Wright, Amanda Plummer, Woody Harrelson, entre outros). O único porém é que, como quase todo capítulo do meio de franquias (Matrix Reloaded, O Senhor dos Anéis: As Duas Torres) parece menos uma produção completa e mais um mero episódio final de meia-temporada de seriado, deixando demasiados ganchos para um terceiro filme do que seria de se esperar. Se funcionasse como um filme completo, seria um filmaço. Assim como está, é de se rezar que pelo menos mantenham a mesma qualidade no desfecho da trama. Se conseguirem, a jornada até aqui terá compensado. Nota 7,5
183 - O Cavaleiro Solitário (The Lone Ranger, 2013): produto da ambição desenfreada dos executivos de Hollywood, essa adaptação do seriado televisivo resultou, além de um dos maiores fracassos do ano, em um filme no mínimo estranho. Tentando a todo custo criar uma nova franquia tão rentável quanto a de Piratas do Caribe, o diretor Gore Verbinski e os roteiristas Ted Elliot e Terry Rossio se reuniram ao protagonista daquela série, Johnny Depp, para tentar replicar a galinha dos ovos de ouro que conseguiram nos filmes protagonizados por Jack Sparrow, dessa vez tendo o Velho Oeste como cenário. Nem tudo saiu como deveria. Se por um lado Depp mais uma vez rouba o filme para si, entregando um personagem bizarro e divertido para a sua galeria de tipos esquisitos, por outro esse Cavaleiro Solitário carece de um protagonista com um mínimo de empatia (em seus melhores momentos, o insosso Armie Hammer consegue apenas servir de escada satisfatória para as micagens de Depp). Também faz mal ao roteiro o excesso de pretensão, resumido na interminável metragem do filme: são duas e meia que passam lentamente (e desnecessariamente) diante dos olhos do público. Se aqui e ali há boas cenas (as duas sequências de ação envolvendo trens, principalmente a que abre o filme, são muito divertidas), por outro lado há subtramas em demasia (e todas chatas até dizer chega). E se Gore Verbinski já demonstrara ser um grande fã de faroestes no sensacional Rango, aqui ele parece não saber muito bem equilibrar as suas homenagens. Há um desvio de tom incômodo na narrativa: em alguns momentos, um massacre sombrio de índios é sucedido, na mesma cena, por uma cena cômica digna dos Três Patetas. Essa indefinição temática torna o roteiro truncado, prejudicando o viés político do roteiro, que se pretende uma inversão da temática da vilanização dos nativo-americanos (e nada mais clichê do que colocar os ferroviários como os bandidões da vez, recurso já esgotado pelo cinemão americano nos últimos anos, vide As Loucas Aventuras de James West, outra superprodução que fracassou nas bilheterias). No final das contas, esse O Cavaleiro Solitário nem merecia o destino inglório que o público lhe reservou (até que é um filme que diverte medianamente), mas não é nem de longe o épico bang-bang pretendido por Verbinski. Nota 6
* 184 - Vovô Sem Vergonha (Jackass Presents: Bad Grandpa, 2013): nunca gostei da franquia Jackass, seja do seriado na MTV ou dos filmes lançados no cinema, que eu acho de um mau gosto que extrapola qualquer empatia. Dito isso, esse Vovô Sem Vergonha é o melhor produto com a grife dessa trupe de dublês. Na realidade, é uma série de pegadinhas filmadas pelo interior norte-americano, com um fiapo dispensável de história (um avô desbocado, alcoólatra e irresponsável que tem de conduzir o neto de uma ponta a outra dos EUA para deixá-lo com o pai) que mais incomoda do que faz o filme decolar. O que a produção tem de melhor mesmo é essa raiz plantada por filmes como Borat e Brüno, de Sasha Baron Coen (infinitamente mais apurados em termos de humor), em que a reação dos anônimos incrédulos diante de situações bizarras garantem as ridadas do público. No caso de Vovô Sem Vergonha, há um punhado de momentos impagáveis, como a cena do velório e aquela passada em um clube de strip-tease para mulheres, os melhores momentos do filme. Também há a escatologia típica de Jackass, mas nesse caso aqui ela não prejudica, pois a tirada cômica sempre vem da reação das pessoas à situação e não do próprio ato em si. Colaboram demais para o resultado final a verve para o improviso de Johnny Knoxville e o desembaraço do pequeno Jackson Nicoll, um verdadeiro achado e um autêntico cara-de-pau mirim. São deles, quando confrontados com populares desavisados, as melhores cenas do filme. E eu confesso que, em um ano difícil para comédias como 2013, me peguei gargalhando em vários momentos. O resultado é tão divertido como uma coletânea de "câmeras escondidas" do Silvio  Santos. Não dá para errar quando a base é essa. Nota 7,5
* 185 - Pulp Fiction - Tempo de Violência (Pulp Fiction, 1994, no Vivo Open Air): assistir ao segundo filme de Tarantino depois de tanto tempo e ainda na tela gigantesca montada pelo Vivo Open Air foi uma experiência que eu não tinha idéia do quanto me impactaria. E impactou. Muito. Rever aquele que é tido como o "marco da geração X" (que é posterior à minha, registre-se) em tela grande foi uma feliz experiência para quem, já adulto, mas nem tanto, tinha se deixado levar pela profusão de referências pop e pulp do filme. Pulp Fiction é realmente um marco do cinema. Desde o resgate de atores na época esquecidos (Travolta, Eric Stoltz, Rosanna Arquette), a violência mais sugerida do que mostrada até o brilhantismo com que lapida os diálogos precisos de seus personagens, Pulp Fiction é um filme-referência em si próprio. Muito antes de lançar o seu olhar (sempre autoral, diga-se) sobre gêneros específicos (os filmes de kung fu em Kill Bill Volumes 1 e 2, os filmes de guerra em Bastardos Inglórios, os faroestes em Django Livre), Taranta fez aqui um trabalho absolutamente original, que transcende gêneros, fórmulas e mesmo o material que homenageia (as pulp fictions do título). Uma obra-prima em que todas as variáveis contribuíram para que o resultado fosse não menos do que impecável. O melhor trabalho do diretor, sem sombra alguma de dúvida. Nota 10  
* 186 - Como Não Perder Essa Mulher (Don Jon, 2013): por trás da infeliz (e imbecil) tradução do título original para o português, que pressupõe que a produção seja uma comediazinha romântica rasteira como aquelas despejadas sem dó nem piedade nos cinemas brasileiros semanalmente, esconde-se um filme que transcende gêneros e representa um sopro de vida na formulaica representação dos relacionamentos vinda das terras do Obama. Bem mais picante do que sonham as patricinhas facilmente ruborizáveis, o filme concentra as atenções em um protagonista que representa o próprio macho-alfa moderno, preocupado com o corpo, o carro e o status, colecionando presas em noitadas, mas que ainda assim só consegue atingir o orgasmo genuíno através da pornografia via internet. Partindo dessa premissa, Joseph Gordon-Levitt (500 Dias Com Ela, O Cavaleiro das Trevas Ressurge), em sua estreia como diretor e roteirista, compõe um cenário acurado sobre as relações modernas, sem nunca deixar de lado o realismo no trato de seus personagens. E se Gordon-Levitt (também o protagonista) e Scarlett Johansson (absolutamente deslumbrante) entregam atuações sinceras e que casam perfeitamente com o realismo pretendido pelo longa, são mesmo os coadjuvantes, principalmente Julianne Moore, Tony Danza (Não Mexa Com A Minha Filha) e Glenne Headly (Dick Tracy) que garantem os melhores momentos do filme. Ao invés de investir na manjada fórmula esquemática do "encontro-desencontro-reencontro" que norteia 9 em 10 comédias românticas produzidas por Hollywood, o roteiro dá uma guinada à esquerda no terceiro ato que torna o resultado prazerosamente imprevisível. Belo trabalho de estréia atrás das câmeras de um cara que nos últimos anos vem se destacando mais e mais à frente delas. Nota 8
** 187 - O Hobbit: Uma Jornada Inesperada (The Hobbit: An Unexpected Journey, 2012): revisto um ano depois, esse primeiro capítulo da nova trilogia tem os seus defeitos bem mais expostos do que da primeira vez dentro da sala escura e em 3D reluzente. Há um óbvio descompasso narrativo, causado principalmente pela discutível opção em esticar o material original com o objetivo de arrecadar mais grana dos fãs. Particularmente, o começo é o trecho mais problemático aqui, com praticamente nada relevante acontecendo em cena enquanto somos apresentados a 13 anões que nunca ganham contornos que minimamente os individualizam. E torcer por um grande número de personagens desconhecidos é tarefa de gincana. Por outro lado, é inegável que, aqui e ali, Peter Jackson consegue recapturar o tom de encantamento e aventura da trilogia dos Anéis. E isso faz muita diferença nos dois atos finais da produção. Há um bom clímax, o retorno de personagens memoráveis (Gandalf, Galadriel, Elrond, Saruman, Frodo, Gollum) e um visual (e climão) que parece saído diretamente das três primeiras adaptações de Tolkien comandadas por Jackson. Um filme que poderá se tornar algo totalmente diferente quando encerrada a nova saga, daqui a um ano. Nota 7,5
  * 188 - O Hobbit: A Desolação de Smaug (The Hobbit: The Desolation Of Smaug, 2013, em 3D, no IMAX): verter um livro de apenas duzentas e poucas páginas em três filmes com quase três horas de duração cada um é uma manobra com evidente fim mercadológico. E os detratores dessa opção não deixam de ter boa parcela de razão. É visível que a história está sendo espichada até o limite do impossível para que a jornada do hobbit Bilbo Bolseiro e dos 13 anões que o acompanham consiga arrecadar o máximo de dólares que a franquia possa tirar da carteira do público. Há nesses filmes uma incômoda barriga que não havia na trilogia original de O Senhor dos Anéis, com uma trama que inegavelmente se arrasta por muito mais tempo do que seria prudente. Dito isso, o mesmo tom épico e o notável clima de aventura que Peter Jackson soube filtrar como ninguém para o cinema nos três O Senhor dos Anéis estão de volta nessa nova série de filmes. Bastante superior ao primeiro filme, que dividiu opiniões no ano passado, essa sequência acerta alguns descompassos da produção anterior. Em primeiro lugar, não há uma introdução interminável como aquela do filme de 2012. Em A Desolação de Smaug, o público é lançado diretamente dentro da ação, que mantém-se sempre presente durante o desenrolar da história. O hobbit Bilbo é uma criação tão divertida e adorável de Martin Freeman (O Guia do Mochileiro das Galáxias) que acaba por compensar a completa apatia do outro protagonista, Thorin, o líder dos anões, que continua sendo um anti-herói irritante que em nenhum momento consegue conquistar o público. Até chegar ao aguardado encontro com o dragão, Peter Jackson enche a tela (e os olhos da plateia) com cenas de ação de tirar o fôlego (toda a sequência que envolve a descida de um rio dentro de barris é uma das melhores coisas já feitas em termos de adrenalina no cinema nos últimos anos) e um visual que requer um esparadrapo para que o queixo não caia (quem puder, que veja no 3D espantoso da sala IMAX de Porto Alegre, uma experiência única). Mais sombrio e muito mais cheio de personagens e subtramas do que seu antecessor, o filme também acerta ao trazer de volta o elfo Legolas (Orlando Bloom), que, junto de Tauriel (Evangeline Lilly, do seriado Lost, lindíssima), é responsável pelas melhores acrobacias que a tecnologia moderna é capaz de coreografar. E não dá para esquecer do dragão Smaug (voz de Benedict Cumberbatch, de Star Trek – Além da Escuridão), talvez uma das criações digitais mais impressionantes de que se tem notícia. É disparado o dragão mais realista já mostrado pelo cinema. Porém, como todo capítulo intermediário, O Hobbit – A Desolação de Smaug é um filme incompleto. Quando se aproxima o clímax (na realidade, justamente em meio a ele), a tela escurece e sobem os créditos. Só no ano que vem para a jornada chegar ao fim, quando todos teremos que comprar mais ingressos, pipoca e refri para descobrir como raios isso termina. Como tudo em Hollywood, O Hobbit também é basicamente uma questão de cifras. Nota 8
 * 189 - Ender´s Game - O Jogo do Exterminador (Ender´s Game, 2013): inspirado em mais um best-seller focado no público adolescente (atual praga que inferniza a vida dos cinéfilos pela obscena quantidade de salas que ocupam a cada novo lançamento, tirando a chance de filmes voltados para o público adulto conseguirem uma janela de exibição no circuito comercial), esse Ender´s Game surpreende pelo tom blasé da trama, que não possui um único elemento realmente impactante ou memorável que justifique a legião de fãs do romance original. O roteiro segue, na verdade, o passo a passo de um filme militar, só que ambientado no futuro distante. E dê-lhe sessões de treinamento, o proverbial antagonismo entre cadetes e o confronto entre os jovens com seus superiores durões (Harrison Ford até se sai bem, mas seu personagem é aquele amontoado de clichês previsíveis dentro do gênero). Tem duas cenas bem orquestradas, que se passam em ambiente de gravidade zero, assim como há, sob a superfície, uma mensagem anti-belicista relevante, bem como uma reviravolta final que realmente surpreende quem não leu o livro (o meu caso). O problema é que essa virada na história só seria realmente bem-sucedida se precedida por um clímax empolgante, o que o filme surpreendentemente não entrega. O resultado final é bem meia-boca. Não chega a irritar e em alguns momentos até entretém, mas também nunca chega a decolar como as inúmeras espaçonaves digitais presentes no longa. Nota 5,5
190 - Kick-Ass 2 (Kick-Ass 2, 2013): poucas vezes na história recente do Cinema a troca no comando de uma produção resultou em uma queda livre tão acentuada quanto nessa continuação do excelente Kick-Ass - Quebrando Tudo, de 2010. Para uma adaptação de HQs que buscava virar franquia nas telonas, a decisão de substituir o ótimo Matthew Vaughn (Nem Tudo É O Que Parece, X-Men: Primeira Classe), que caiu fora do posto de diretor, pelo inexpressivo Jeff Wadlow (Cry Wolf - O Jogo da Mentira e Quebrando Regras) teve como efeito direto retirar do projeto justamente os elementos que fizeram do filme original uma diversão tão eficiente. Não há nesse novo capítulo nem rastro da desenvoltura com que Vaughn conseguia equilibrar ação, comédia, sátira e crítica. O que se vê aqui é um filme que nunca parece decidir-se entre assumir o tom anárquico dos quadrinhos originais ou enveredar pelo caminho das tramas de super-heróis padronizadas pela indústria. Para piorar, a melhor personagem (a Hit-Girl da adorável Chloë Grace Moretz) está totalmente descaracterizada e passa a maior parte do filme em uma subtrama boboca ambientada no colégio, com direito aos mais rasteiros chavões das comédias adolescentes americanas. E se a grande sacada em Kick-Ass - Quebrando Tudo era justamente ver uma garotinha de 10 anos transformada em ninja e arrebentando os bandidões, esse elemento se esvai na seqüência pelo simples fato da atriz já ter se tornado uma adolescente, o que retira toda a carga de improbabilidade que representava 90% do charme da personagem. Já Christopher Mintz-Plasse (o McLovin de Superbad) fazia um vilão divertido no primeiro filme, mas em Kick-Ass 2 ele ganha ares tão sombrios que acaba soando só irritante. E se há personagens desperdiçados, o que dizer do elenco, que relega a nomes como Jim Carrey e John Leguizamo a poucos minutos de tela, sendo que no caso do último com o agravante de ser reduzido à batida caricatura do capanga descartável. Falhando até mesmo em entregar cenas de ação memoráveis (outro dos trunfos do original), Kick-Ass 2 limita-se a meia-dúzia de tentativas frustradas de seqüências que soam mais bizarras do que efetivas, principalmente pelos efeitos especiais bizarros utilizados. Disparado uma das maiores decepções de 2013, nem tanto pelo que prometia, mas por conseguir errar praticamente todos os alvos acertados pelo filme original. Nota 4
** 191 - Um Corpo Que Cai (Vertigo, 1958): depois de passar por uma restauração que consumiu quase dois anos e um milhão de dólares da Universal, rever agora Um Corpo Que Cai é descobrir um novo filme. Justamente aquele pretendido por Hitchcock, que rodou o longa no então revolucionário VistaVision, com uma paleta de cores surpreendente que enche a tela e é utilizada não só como perfumaria visual, mas como um dos elementos/personagens fundamentais da produção e que esclarece muitos dos pontos obscuros da trama e da motivação de seus personagens. Hábil em conceber cenas que não precisam de nenhum diálogo para resultarem plenamente efetivas, como as memoráveis seqüências em que James Stewart segue Kim Novak por uma São Francisco que poucas vezes foi filmada com tamanha beleza nas telonas, o filme é daqueles imprescindíveis para quem se diz cinéfilo. E foi em Um Corpo Que Cai que Hitchcock realmente comprovou ser um notável diretor de atores. Por trás da trama de suspense que esconde um romance impossível cheio de nuances expressas inclusive através dos cenários (são inúmeros os espelhos e reflexos presentes ao longo da trama), música (a trilha de Bernard Herrmann é um verdadeiro patrimônio da Sétima Arte) e fotografia (com toda a gama de significados escondida por trás da profusão de azuis, verdes, amarelos e vermelhos que permeiam a projeção), é mesmo a extraordinária dupla de protagonistas que consegue externar o que as nuances do roteiro deixam implícitas. E nada melhor do que colocar o eterno bom moço James Stewart no papel de um detetive aposentado que esconde um lado sombrio que vai lentamente revelando traços obscuros e obsessivos, ao passo que Kim Novak (linda e talentosa como nunca) revela-se uma das femme fatales mais humanas já retratadas em celulóide. Uma obra-prima que precisa ser redescoberta em todo o seu esplendor técnico. E é muito importante notar como o choque final, que encerra a trama de forma abrupta, foi homenageado por tantos cineastas em produções posteriores, desde Scorsese e De Palma até Fincher e Nolan. Nota 10 
* 192 - A Vida Secreta de Walter Mitty (The Secret Life Of Walter Mitty, 2013): gosto muito de Ben Stiller como diretor. Caindo Na Real (Reality Bites), Zoolander e Trovão Tropical são filmes que demonstram que, por trás da fachada de palhaço das massas, esconde-se um autor com muito bom senso de narrativa cinematográfica e um timing cômico bizarro e estranho (e, por isso mesmo, mais refinado). Esse remake de O Homem de 8 Vidas, de 1947, foi precedido por um ótimo trailer ao som de Dirty Paws, da banda Of Monsters And Men (da trilha de Onde Vivem Os Monstros), mas que escondia de certa forma as reais intenções por trás do projeto, muito mais um "feel good movie" com mensagem edificante do que propriamente uma comédia de erros. Mas a boa mão de Stiller continua evidente aqui. Desde os créditos iniciais até os finais, percebe-se um talento genuíno para a concepção de cenas plasticamente belíssimas, desde os delírios do protagonista até as viagens propriamente ditas. Há também momentos de humor inspiradíssimos, como aquele passado na Groenlândia e que envolve um piloto de helicóptero bêbado e um embate com um tubarão. Por outro lado, há gags eficientes, mas que destoam do restante do filme, como a engraçada seqüência que parodia O Curioso Caso de Benjamin Button. Se resvala para o sentimentalismo e a pieguice ao final da jornada (e tropeça feio nesse sentido), A Vida Secreta de Walter Mitty empolga durante a travessia. Lindamente fotografado e com algumas sacadas geniais (como colocar Sean Penn, diretor de Na Natureza Selvagem, como o fotógrafo que vive justamente em meio às paisagens mais inóspitas do planeta em busca de imagens que representem "a quintessência da existência humana"), o filme é daqueles que vai torcer o nariz dos fãs do ator enquanto protagonista de comédias bobas, mas de repente vai conquistar o público que gosta de sair do cinema com um sorriso no rosto. Pois nisso A Vida Secreta de Walter Mitty é plenamente bem sucedido: apesar de seus percalços, ao final da viagem é improvável deixar a sala escura sem um prazeroso sentimento de fé na raça humana. Uma diversão que, apesar de alguns equívocos, é muito simpática. Nota 7,5
193 - Conspiração Xangai (Shanghai, 2010): filmes de espionagem ambientados durante a Segunda Guerra Mundial são artigos raros no cinema moderno, mas geralmente são produções que entretêm, mesmo aquelas modorrentas como Enigma, com Kate Winslet, ou implausíveis como Uma Luz Na Escuridão, com Michael Douglas e Melanie Griffith. Esse Conspiração Xangai, superprodução que fracassou nas bilheterias, é um caso desses. O diretor Mikael Hafström (de Fora de Rumo, 1408 e do recente Rota de Fuga) conduz relativamente bem uma trama que, se nunca impressiona, pelo menos não cai totalmente nos clichês mais batidos do gênero. O principal problema aqui é acreditar no protagonista John Cusack (que trabalhou com o diretor no bom 1408) como um agente secreto/galã, o que é sabotado pela falta de porte e pelo ar eternamente blasé do ator. Isso, unido à titubeante (e totalmente desnecessária) narrativa em off, prejudicam muito o resultado final. Mas o elenco de apoio, formado por um impecável elenco (Gong Li, Chow Yun-Fat, Ken Watanabe, Franka Potente, Rinko Kikuchi e Jeffrey Dean Morgan), e as boas cenas de tensão e ação tornam a produção, mantida a expectativa controlada e baixa, numa boa sessão para um sábado à noite. Nota 6,5   
 
 
     
 
 
 

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