O Homer Vitruviano

O Homer Vitruviano
Leonardo quase acertou.

Wel Come Maguila, Mas Manda Flores No Dia Seguinte

Bem-vindos, párias, desgarrados, nerds, loucos de toda espécie ou, caso esse negócio não der certo, boas vindas às minhas demais personalidades. Façam-se ouvir, façam-se sentir, façam-se opinar. E, caso falte energia ou acabe a bateria, faça-se a luz!


domingo, 21 de novembro de 2010

O Nascimento do Brasil


(texto levemente diferente de outro produzido para a Revista Rua Grande, metralhado pelo próprio Autor)

Há três anos (e isso parece mentira), o primeiro Tropa de Elite transformou-se em fenômeno popular um mês antes da estréia nos cinemas. Todos conhecemos a história: algum babaca conseguiu a cópia do filme e disponibilizou-a ao nosso pujante mercado negro da pirataria. De cópia pirata em cópia pirata, o boca a boca tornou o filme um sucesso anunciado. Todos gostaram do que viram, apesar da imagem de baixa qualidade e do som de banheiro de rodoviária.

Não se sabe ao certo (e nunca se saberá) se a piratagem de Tropa de Elite foi providencial ou prejudicial para a sua carreira comercial. Os mais de 2 milhões de guerreiros que esperaram para ver a obra no cinema poderiam somar um público maior se muitos não tivessem comprado o disco pirata no camelô de confiança? Os produtores juram que sim. Aqueles que insistem em financiar o mercado negro do cinema insistem que não, quiéisso, capaz.

Mas o fato é que o filmaço de Padilha provou que é possível desenvolver projetos com estofo intelectual voltados para o grande público. O povão tupiniquim. Pão para o cérebro e circo para o coração, conteúdo e entretenimento em um mesmo produto, receitinha básica que Hollywood aprendeu desde os primórdios a desenvolver, mas que nós, brazucas, teimamos em renegar.

A proeza alcançada com Tropa de Elite 2 é maior ainda. Além de apresentar um produto final ainda melhor do que o primeiro filme, José Padilha conseguiu elaborar um filme mais incisivo, mais profundo e muito, mas muito mais complexo.

Se no primeiro capítulo, a lente do diretor concentrava-se na luta direta entre os oficiais do BOPE e os traficantes das favelas cariocas, a sequência amplia esse escopo e desvenda a teia de corrupção que alimenta a violência nos morros brasileiros e cuja gênese está justamente em nossos digníssimos representantes eleitos.

A classe política está no centro do brilhante roteiro de Bráulio Mantovani (não por acaso, também a caneta por trás de Cidade de Deus), que revela o intrincado sistema de escambo entre os políticos, policiais e traficantes.

Esse jogo sujo de favorecimentos e interesses pessoais que garante a subsistência do status quo brasileiro é o centro e o alvo da vez. Nada mais atual em um ano em que cortinas de fumaça como a Copa do Mundo nos anestesiaram de tal forma que não incendiamos o Congresso após a eleição do Tiririca.

Se o capitão Nascimento, irretocável criação de Wagner Moura, continua sendo o personagem mais iconoclasta de nossa cinematografia, em Tropa de Elite 2 também somos apresentados figuras como Fraga (Irandhir Santos, perfeito), o ativista dos Direitos Humanos que condena o uso da violência como forma de repressão ao crime organizado. Nascimento e Fraga são os dois lados da mesma moeda, cada um com suas próprias idiossincrasias e contradições, o que torna os personagens muito mais reais. Um é o sonho de qualquer conservador, o justiceiro eficaz que não perdoa a bandidagem e preserva a integridade intacta no final do dia. O outro é o fetiche de uma esquerda que celebra a teoria, mas não atenta para a prática. São dois arquétipos antagônicos, mas que se completam. Nenhum deles totalmente certo ou totalmente errado em suas convicções. Ying e yang.

E assim como no primeiro filme, Tropa 2 não nos dá resposta alguma, preocupando-se, isto sim, em nos bombardear com as perguntas certas. Aposto uma coleção de VHS dos filmes do Rob Schneider como grande parte do sucesso dos dois Tropa está justamente nos debates acalorados nas mesas de bar após o final das sessões.

Com um ás na manga que outras tantas produções brazucas não consegue dispor: Tropa de Elite 2 também é entretenimento de primeira, um filme policial eletrizante na tradição daqueles surgidos nos EUA na década de 70 (Sérpico, Operação França, entre tantos outros).

E quando uma multidão invade os cinemas para assistir a um filme tão essencial quanto Tropa de Elite 2, é porque o Brasil ainda pode encontrar a luz no fim do túnel.

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