O Homer Vitruviano

O Homer Vitruviano
Leonardo quase acertou.

Wel Come Maguila, Mas Manda Flores No Dia Seguinte

Bem-vindos, párias, desgarrados, nerds, loucos de toda espécie ou, caso esse negócio não der certo, boas vindas às minhas demais personalidades. Façam-se ouvir, façam-se sentir, façam-se opinar. E, caso falte energia ou acabe a bateria, faça-se a luz!


segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Os Melhores Filmes de 2015: Parte 1 - As 12 produções que não estrearam no circuito comercial gaúcho

What We Do In The Shadows


Dando início à retrospectiva dos melhores filmes que eu vi em 2015, aqui listo as produções que infelizmente não ganharam chance nos cinemas do Rio Grande do Sul. Algumas delas foram lançadas diretamente em DVD/Bluray, outras foram parar no catálogo da Netflix, ao passo que alguns dos filmes, por enquanto, só podem ser encontrados pela internet afora. A lista abaixo obedece ordem alfabética:

 
1 - A Viatura (Cop Car, 2015): sucesso no Festival de Sundance de 2015, essa pequena produção de suspense serviu de cartão de visitas para o diretor Jon Watts ganhar da Marvel o timão do próximo filme do Homem-Aranha. E, de certa forma, a honraria é justa. Com orçamento baixíssimo, é um thriller que une o clima de história de amadurecimento de Conta Comigo, tratando seus dois protagonistas de 10 anos como as crianças que realmente são, com a tensão de títulos como A Morte Pede Carona. Kevin Bacon, também produtor do longa, está muito bem como o xerife vilão que persegue os moleques. É o típico caso de produção "slow burn", que vai lentamente sendo construída até o inevitável (e, no caso, sangrento), clímax. Sem nunca ofender a inteligência do espectador, é daqueles filmes que prendem a atenção desde o primeiro instante e não largam mais até a excelente (e incomum) cena final.

2 - Best Of Enemies (Best Of Enemies, 2015): em tempos em que o debate político acabou reduzido a uma gritaria histérica entre dois polos que equivocadamente se vêem como mocinhos de bangue bangue lutando contra índios sanguinários (e imaginários), esse documentário é um tapa de luva de boxe nas verdades incontestáveis vociferadas por cada lado em nossa sociedade. A série de debates entre o liberal Gore Vidal e o reacionário William F. Buckley durante as primárias da eleição americana de 1968 resgata uma época em que o discurso político era encenado por indivíduos com bagagem intelectual acima da média e que, independentemente do lado da trincheira em que se posicionavam, tinham o cuidado em fundamentar seus argumentos com estofo histórico e retórico capaz de elevar a discussão muito além do enfrentamento binário a que se assiste diariamente por meio das modernas redes sociais. Vidal e Buckley eram oradores fascinantes e seu ódio mútuo resulta em um filme irrepreensível, com momentos de embate tão deliciosos quanto elucidativos em relação a seus argumentos. Mais do que um documento de época, Best Of Enemies escancara como involuimos enquanto sociedade. O mundo moderno precisaria de incontáveis Vidals e Buckleys para que a fé na humanidade pudesse ser restabelecida. Excelente.

3 - Complicações do Amor (The One I Love, 2014): irresistível comédia romântica que atropela qualquer clichê do gênero e apresenta um conceito intrigante de realidades paralelas que é muito bem defendido pela dupla central (Mark Duplass, do ótimo Sem Segurança Nenhuma, e Elizabeth Moss, do seriado Mad Men). O roteiro desenvolve a excelente ideia central com maestria, aguçando a mente do espectador na medida certa e propondo várias interpretações à história. Belo trabalho do diretor Charlie McDowell (filho dos atores Malcolm McDowell e Mary Steenburgen), é um dos filmes com maior potencial para virar cult movie que eu vi nos últimos tempos.

4 - Creep (Creep, 2014): um caso cada vez mais raro de filme que opta por narrar sua trama sob a estética do found footage de forma inteligente e orgânica. A atmosfera criada desde a primeira cena, que mescla humor e suspense para ludibriar o espectador sobre o gênero de filme contido no roteiro, é muito adequada, principalmente quando se tem um protagonista como Mark Duplass, egresso de papéis cômicos (Sem Segurança Nenhuma, Complicações do Amor), o que introduz uma bem vinda pulga atrás da orelha do público sobre as reais intenções de seu personagem. Duplass é a alma da produção, construindo um personagem memorável cujas camadas de sua personalidade vão sendo gradualmente desnudadas diante da tela. Um ótimo suspense que guarda surpresas muito bem vindas até a sua cena derradeira.

5 - Escapes de Gas (Escapes de Gas, 2014): uma aula de história que é tão política quanto sociológica, esse pequeno grande filme chileno foca um prédio para promover uma discussão histórica, algo que já, em sua gênese, atribui ao filme uma importância que nunca teria em mãos inadequadas. Ferino, revolucionário e muito bem construído, Escapes de Gas regurgita liberdade em tempos em que há quem defenda o militarismo.
 
6 - Ex Machina: Instinto Artificial (Ex Machina, 2015): não poderia ser melhor a estreia na direção de Alex Garland (roteirista de Extermínio e Dredd), que consegue não só amplificar a temática sócio-futurista de seus trabalhos anteriores, mas focar em assuntos ainda mais fascinantes (e atuais). Tendo como base a relação entre homem e máquina, Garland filma (na verdade, pinta, tamanha é a plasticidade das imagens concebidas pelo agora cineasta) seu roteiro como um intrincado jogo de xadrez entre criador(es) e criatura(s), em que nada é o que parece ser a primeira vista e cujo desenrolar revela uma pertinente discussão sobre a ética e a moralidade que antecedem a criação tanto científica quanto artística. A direção de arte beira a perfeição, abusando de detalhes quase imperceptíveis a primeira vista em seu (praticamente) único cenário (a mansão de Oscar Isaac, de Inside Llewyn Davis, ótimo em cena). Todos os diálogos travados entre Domhnall Gleeson (Questão de Tempo) e Alicia Vikander (O Amante da Rainha) são impecáveis e cheios de significados. Uma ficção científica feita por adultos e com foco em gente grande. Filmaço.

7 - Going Clear: Scientology And The Prison Of Belief (Going Clear: Scientology And The Prison Of Belief, 2015): dirigido pelo oscarizado Alex Gibney (Um Táxi Para A Escuridão), é um documentário que ousa escancarar os bastidores da Cientologia e demonstrar que, por trás de uma fachada íntegra, esconde-se uma religião que prega em seu âmago o mercantilismo selvagem, nem que para isso sejam praticados atos de corrupção, lavagem cerebral e mesmo violência física e mental contra seus seguidores (os depoimentos de ex-fiéis, dentre eles o cineasta Paul Haggis, são aterrorizantes). Envolvente em sua impecável estrutura investigativa e ousado ao apontar as idiossincrasias da religião ao mesmo tempo em que se resguarda de declarações que pudessem fundamentar ações judiciais, Going Clear, se não tivesse entre seus alvos personalidades como Tom Cruise e John Travolta (ambos retratados como vítimas de uma ideologia que lhes foi imposta e da qual viraram reféns), poderia ter como tema central qualquer outra seita ou agremiação religiosa extremista, o que confere ao filme caráter universal e importância além de seu tema central.

8 - Life Itself - A Vida de Roger Ebert (Life Itself, 2014): ótimo documentário que faz uma varredura precisa da vida de Roger Ebert, um dos melhores críticos de cinema que o mundo já viu. Sem medo de abordar os seus defeitos de caráter, o cineasta Steve James (Basquete Blues) oferece um insight precioso sobre a personalidade idiossincrática de seu biografado, nunca lhe poupando de seus momentos mais mundanos (as sessões de sucção após suas cirurgias, por exemplo, são tão chocantes quanto emblemáticas). É um relato profundo e muito esclarecedor sobre um homem que viveu a vida assistindo a filmes. Um belo legado em celuloide que faz jus ao seu personagem e a qualquer cinéfilo.

9 - Starry Eyes (Starry Eyes, 2014): o que começa como um interessante registro da tentativa hercúlea de uma aspirante a atriz em ascender no mercado inglório de Hollywood reserva para o final uma reviravolta que faz a historia da protagonista (a ótima Alex Essoe) virar um terror viajandão e muito impactante. A narrativa explora de forma eficiente as agruras e os horrores por trás da chamada "cidade dos anjos". Bem interessante.
 
10 - Tangerinas (Mandariinid, 2013): indicado ao Oscar 2015 de Melhor Filme Estrangeiro representando a Estônia, é um dos mais lindos libelos contra a guerra dos últimos anos. Filmado com muita classe pelo georgiano Zaza Urushadze (guarde esse nome!), é dessas pequenas odisseias que utiliza um microcosmo conciso para entregar uma mensagem universal. Fotografado lindamente e com uma trilha sonora irrepreensível, Tangerinas ainda tem no seu enxuto elenco um de seus maiores acertos (o protagonista interpretado pelo estoniano Lembit Ulfsak poderia muito bem ter sido indicado ao Oscar, o mesmo valendo para a excelente trinca de coadjuvantes). Antibelicista sem soar discursivo e alternando momentos de ternura, bom humor e violência, é um filme que deixa um gosto ao mesmo tempo cítrico e doce ao final da projeção. Exatamente como o das tangerinas que desencadeiam sua trama. Imperdível.

11 - Virunga (Virunga, 2014): importante, belíssimo e eficaz documentário que registra a situação dramática de um parque nacional do Congo, cujo solo é disputado por ambientalistas, grandes conglomerados empresariais e a milícia que a todo momento ameaça o governo do país. Excelente em sua abordagem milimétrica da frágil situação que envolve o parque de Virunga, o filme tem um ritmo eletrizante, que combina documentário, filme de espionagem e de guerra durante sua metragem, algo que lhe distancia das abordagens didáticas da maioria dos registros documentais feitos atualmente. Funciona tanto como alerta ambiental sobre a preservação de sua fauna natal (os gorilas da montanha retratados são adoráveis e carregam um mensagem ecológica em si próprios) quanto como thriller político utilizando imagens reais e impactantes da situação atual do Congo.

12 - What We Do In The Shadows (What We Do In The Shadows, 2014): lembra muito os primeiros filmes de Mel Brooks, onde a paródia a um gênero específico do cinema soava mais como homenagem do que propriamente tiração de sarro, mas há ecos aqui também do humor do Monty Python, principalmente na opção de entregar piadas ue comungam com a violência intrínseca ao gênero que parodia/homenageia. Comandado e atuado pelos criadores/intérpretes da cultuada série Flight Of The Concords, é um filme em que tudo dá certo. A opção pelo falso documentário, ao invés de se tornar esquemática, revela-se uma decisão acertadíssima e que consegue desenvolver os seus quatro personagens de forma impecável. O resultado é hilário, um dos grandes filmes sobre vampiros já realizados nos últimos anos. E Petyr já é desde sempre um dos melhores anti-heróis concebidos em celuloide. Para ver, rever e gargalhar sempre.

Nenhum comentário:

Postar um comentário